O almoço (conto)

   Essa é a oitava história da terceira temporada da Novelinha <3 

Se ainda não leu a sétima, "Meia-volta", clique aqui.


Nos últimos cinco anos, a rotina de Andreia era exatamente igual, ao menos em seis dos sete dias da semana. Acordava sempre por volta das dez, às vezes 11h da manhã, a depender da hora que tinha ido deitar na noite anterior. Trabalhava no segundo turno nO Bistrô, ela e seus colegas eram os responsáveis por fechar o estabelecimento, então no dia seguinte só saía cedo da cama quando precisava resolver algo na rua, ou quando eventualmente era chamada em cima da hora para cobrir alguém do primeiro turno no trabalho.  

Este foi o motivo que a fez deixar suas cobertas bem cedo, numa terça-feira preguiçosa que, a depender exclusivamente de sua vontade, ela honestamente teria inventado alguma desculpa só para não fazer hora extra. Mas atendeu ao pedido de Zezé, que além de gerente também era sua amiga, porém isso não significava que faria o favor de bom grado ou com paz no coração.

Ao abrir o guarda-chuva na calçada, no intuito de não desfazer a chapinha passada às pressas no cabelo, praguejou contra Pedro, que tinha faltado no serviço, xingou mentalmente Zezé, por tê-la acordado com um pedido de urgência, sobrou até para Patrícia, que era a dona do restaurante e, claro, Mariana, seu foco preferido de reclamações. Já era um hábito direcionar cada uma de suas frustrações diárias nela, e isso vinha de antes mesmo de ser contratada como garçonete em um dos restaurantes mais conhecidos do brejo paulistano. Toda sapa ou já conhecia ou tinha planos de um dia comer nO Bistrô, que muito mais do que um local friendly, era comandado pela lésbica mais conhecida do rolê. Uma das mais bonitas também.

Patrícia tinha o bônus de não apenas ser assumidamente homossexual, como também era casada com duas mulheres. A cereja do bolo, na opinião de Andreia, é que uma delas era Mariana. Sim, Mariana, sua ex que no passado jurava que nunca iria se casar.

A história entre Andreia e Mariana era um tanto quanto conturbada, como costumam ser os relacionamentos com pessoas instáveis. E olha que este era só o adjetivo mais educado que Andreia escolhia de seu vasto repertório quando o assunto era Mariana, alguém que não se satisfez de ficar no passado e que agora esfregava a própria presença no presente. Pior: no seu ambiente de trabalho. 

Mariana era muito mais do que uma simples ex ficante, ou ex qualquer coisa, como queira chamar. Ela era também uma das maiores vilãs na trama de Andreia, que foi traída da pior maneira! E ver Mariana no restaurante quase diariamente, inevitavelmente a remetia de volta para uma das situações mais vexatórias de sua vida inteira. Decerto este era o motivo que vinha deixando Andreia tão raivosa nos últimos tempos. Além de ter que esbarrar em Mariana, nesses encontros ainda era obrigada a ver sua felicidade, a contragosto.

Não que ainda gostasse dela. Mas com o tempo, a ex acabou virando uma espécie de obsessão. Ao menos esta era a teoria que Priscila, irmã de Andreia, defendia. 

- Bom dia, nem sei como te agradecer, grata por ter vindo – Zezé a cumprimenta, atropelando as palavras, assim que a vê entrar pelos fundos do restaurante. Estava sentada atrás de sua mesa apinhada de papéis e tinha uma ruga de preocupação marcando o meio da testa. Parecia sempre diferente sob a luz matinal.

– De nada, Zezé, bom dia – Andreia responde, com um suspiro pesado acompanhando as palavras – Foi por você que eu vim, saiba.

– Eu sei. E agradeço novamente – ela dá uma piscadinha, puxando uma nota fiscal de uma pilha de documentos – O Pedro se acidentou, caiu de moto. Não é nada grave – Zezé se adianta, erguendo a mão ao ver a expressão de susto da garçonete – Mas ele quebrou a perna.

– Putz – foi tudo o que Andreia conseguiu dizer. Se arrependeu nessa hora de ter praguejado contra o colega, que já tinha dobrado turno várias vezes para lhe dar cobertura, quando ela precisou faltar – E aí, quanto tempo afastado? Você vai chamar alguém até a volta dele, né?

– Vou precisar chamar, não posso te pedir para fazer hora extra até lá.

– É, não pode – Andreia retruca, amarrando o cabelo para passar pela cozinha. Ainda era cedo, mas acreditava que a chef já estivesse por ali e ela ficava furiosa com quem entrava no salão de cabelo solto.

– E sua irmã? – Zezé pergunta, sem encará-la – Você comentou que ela estava de férias, né?

– Jamais que eu vou chamar a Pri para trabalhar durante as férias dela. Ainda mais aqui! – o final da frase saiu um pouco esganiçado.

– Esse tipo de comentário sempre me deixa reflexiva – Zezé comenta, agora a olhando nos olhos – Você sabe que comprei seu lado numa briga que sequer conheço...

– Zezé... – Andreia interrompe, levantando os olhos.

– Não, tudo bem – Zezé continua – Eu tenho no meu coração que no dia que você achar que eu mereço saber, você vai me contar.

– É só que essa é uma história muito chata, muito pessoal... – Andreia resmunga, desconversando.

– Tudo bem, não estou pedindo para que me conte agora. Só quis dizer que estou do seu lado nessa rinha, sempre estive, mesmo sem você ter me contado o que rolou. Mas isso não me impede de pensar mil coisas, que provavelmente são até mais monstruosas que a realidade.

– E isso é pior do que não saber da verdade, de fato? – Andreia parecia sorrir, mas se manteve séria.

Zezé era sua aliada no trabalho. Aquele tipo de colega que sabe tudo o que se passa no ambiente, cada fofoca, todas as histórias do passado, os causos que ficaram marcados, tudo. Estava com Patrícia desde o começo, praticamente, o que também a fazia ser aliada da chef, que era chefe de todos por ali. E se havia uma palavra que a definia bem era “lealdade”. No sentido mais amplo possível!

Foi Zezé quem contratou Andreia, quando ela nem tinha exatamente alguma experiência no ramo – seu primeiro emprego foi temporário, no café onde a ex trabalhava. Só depois foi conhecer Mariana, que coincidentemente acabou virando ex de Gisele também. E um tempo se passou até que Mariana se envolvesse com Patrícia e Tatiana, assumindo com elas um relacionamento bem distante do convencional e do remotamente imaginável. Ou seja, surgiu com nova roupagem numa história antiga, e que Zezé realmente não conhecia porque Andreia nunca havia contado.  

Mas bastou para a gerente um relato superficial pintando Mariana como a pior pessoa da Terra para Zezé comprar a briga de Andreia. Em seu íntimo, acreditava que Mariana não era uma boa pessoa. Ou melhor, não era a melhor pessoa para se meter naquilo que ela jurava ser o casamento perfeito entre Patrícia e Tatiana. 

Além disso, Zezé era boa observadora, tinha o olhar atento e a escuta bem aguçada. Sabia que Mariana era dona de um passado vasto, recheado de várias mulheres. Tantas que até desconfiava que a chef e sua esposa pudessem talvez nem mensurar a quantidade exata.

Ainda assim, mesmo diante desta incontestável prova de amizade, Andreia nunca tinha se sentido confortável para compartilhar com Zezé sua experiência pesada com Mariana. Em todo o mundo, apenas sua irmã sabia do ocorrido e só porque ela estava envolvida no rolo também. 

– Talvez. Ainda assim, respeito sua privacidade – Zezé responde, depois de alguns segundos – Olhe, vou te repassar a escala do Pedro, você assume a seção dele, para não bagunçar o resto – ela aponta para uma imagem do salão do restaurante, com a disposição das mesas e cadeiras separadas em três cores. Circulou com uma caneta vermelha a área próxima à porta giratória – Durante o almoço você fica aqui, preciso que me ajude a olhar a nova bartender.

– Mas o bar fica do outro lado do salão! – Andreia reclama, cruzando os braços.

– Sim, mas daqui você consegue ver. Só olha, Andreia, por favor – Zezé pede, descendo os ombros sem perceber.

– O que houve com a Lola, afinal? Por que ela saiu tão de repente?  Ninguém imaginava que fosse se demitir assim, sem mais nem menos.

– Não sei, ela não me disse – Zezé afirma, com meias verdades.

– Sei – Andreia rebate, cerrando um pouco os olhos, desconfiada. Este era mais um motivo para não contar tudo à Zezé: a gerente também guardava alguns segredos.

 Sem dizer mais nada, Andreia deixa a saleta, passando pelo corredor estreito em frente à cozinha. Pela parede transparente, viu que o local ainda estava vazio e nem mesmo a chef se encontrava por ali. Antes que tivesse tempo de pensar em alguma coisa, ouviu vozes vindas do salão, e em silêncio observou Patrícia e Mariana sentadas em uma das mesas – naquela do canto, a preferida da dona dO Bistrô.

 Achou curioso porque elas não pareciam ter chegado juntas, aí ficou imaginando que certamente Mariana havia aprontado alguma e estava ali para se redimir, se desculpar. Uma rosa solitária em cima da mesa compunha a cena, incrementando o que sua mente inventava.

Mesmo longe, reparou que Patrícia tinha cortado o cabelo. Ou só fazia tempo que não a via sem a proteção na cabeça, que praticamente a transformava em outra pessoa quando se deixava ser vista de franja solta. Andreia a achou bonita naquela manhã, embora parecesse preocupada, e foi reparando no seu gestual que a narrativa recém-criada parou de fazer sentido. Dali, pareceu que, se havia algo errado, não era Mariana quem tinha “culpa no cartório”. O fato de a ex sair carregando a flor vendida em semáforo comprovou isso.

– Bom dia, mudou de turno? – Patrícia a cumprimenta, a caminho da cozinha. Definitivamente ficava mais bonita sem todo aquele aparato de chef. Menos imponente, mas belíssima.

– Oi, bom dia. Sim, o Pedro se acidentou, a Zezé me pediu para vir – Andreia responde, pigarreando – Acho que cheguei muito cedo...

– Nossa, eu não sabia – ela puxa o celular do bolso da calça, só então lendo a mensagem enviada mais cedo pela gerente. Um molho de chaves tilintou em sua mão – Geralmente a Tati é quem cuida dessas coisas... – Patrícia complementa, pensando em voz alta, digitando algo.

– Ah, sim. E está tudo bem? Faz tempo que não a vejo por aqui... – Andreia comenta. A pergunta faz a chef levantar os olhos da tela para encará-la, antes de responder.

– Está tudo perfeitamente bem, ela só... anda muito ocupada, só isso – Patrícia se vira ao ouvir um barulho vindo da porta e por cima do ombro vê Mariana, entrando de volta – Você ia embora sem sua chave do carro? Como conseguiu esquecer? – ela pergunta para a esposa. 

– Esquecer das coisas é fácil, difícil é me lembrar... – Mariana resmunga, empurrando os óculos para perto dos olhos – Bom dia – ela cumprimenta Andreia, pegando as chaves que Patrícia lhe entregava – Tudo bem?, mudou de turno?  

– O Pedro caiu de moto – Patrícia diz, diante do silêncio da garçonete, que não respondeu de propósito.  

– Sério, foi grave? Ele se machucou? – Mariana questiona, aspirando o remédio da bombinha de asma. Desviou o olhar para o teto quando Andreia a encarou.

– Ele quebrou a perna, vou visitá-lo no hospital – Patrícia faz um biquinho e observa a esposa, dando uma olhada rápida para Andreia, antes de continuar – Seria tão bom se... 

– Sim, vou conversar com a Tati – Mariana responde, interrompendo, como se elas falassem por códigos. 

 Andreia fingiu fazer qualquer coisa, vendo Patrícia e Mariana caminharem juntas em direção à porta dO Bistrô. De costas, admitiu que as duas combinavam, como se tivessem planejado se vestir de maneira que se complementassem. A garçonete então dedicou alguns segundos refletindo sobre o que poderia ter causado o sumiço repentino de Tatiana dO Bistrô, que constantemente dava a impressão de ser até mais gerente que Zezé. Ou mais proprietária que Patrícia. Só não parecia mais esposa que Mariana, que se despedia agora da chef com um beijo na boca. Um privilégio de poucas.

 Ao ver Patrícia voltar, distraída com algo no celular, Andreia considerou que seu semblante estava bastante cansado – mais do que em qualquer outra ocasião em que a chef igualmente tenha dado a impressão de estar esgotada (geralmente isso ocorria em fins de ano, quando a demanda aumenta perto das férias coletivas). Agora, parecia algo além do cansaço cotidiano; havia claros sinais de problemas no paraíso e pensar nisso fez Andreia sorrir, um pouco maldosa. Não porque desejasse algum mal para o trisal, mas o bem também não fazia parte exatamente de seus desejos mais íntimos. 

A curiosidade em saber o que se passava de errado com o trisal foi o que naquela manhã fez Andreia decidir abrir o jogo com Zezé, na primeira oportunidade que surgisse. Contaria tudo o que Mariana havia feito, desde que em troca a gerente revelasse os problemas que afetavam a felicidade da ex. Teria algo a ver com a demissão repentina de Lola? Precisava tirar essa história a limpo também. 

 Porém, embora quisesse muito fofocar, Andreia passou a manhã toda ocupada, arrumando o salão para os clientes que logo começariam a chegar. Nos intervalos não pode conversar com Zezé, que de manhã era ainda mais ocupada do que no período noturno. Andreia até chegou a pensar em como seria mais difícil caso a gerente tivesse se acidentado, ao invés do garçom, mas não foi muito longe porque costumava ter o mesmo pensamento com relação à Tatiana, que de fato comandava tudo no restaurante e era a responsável pelos detalhes que faziam a diferença. E nada tinha ruído em sua ausência.

 Tatiana estava sumida desde o baile da Rubi. Andreia se lembrou disso assim que viu uma das publicitárias da agência chegar aO Bistrô, perto de meio-dia. A mulher, alta, elegante e bem vestida, pediu mesa para duas pessoas e uma água com gás. Disse que aguardaria a chegada de alguém para fazer o pedido do almoço, mas quis ver o menu mesmo assim. Parecia incomodada por ter chegado sem sua companhia e Andreia tratou de atendê-la rápido para que a frustração da mulher não se virasse contra ela. Estava voltando do bar quando viu Elias passar pela porta giratória, entrando no restaurante.

 Graças à Zezé, Andreia sabia de seu parentesco com Mariana, e sempre que o via era inevitável não pensar na capacidade que a ex tinha de ser ardilosa e conseguir esconder as coisas. Afinal, ela jamais sequer comentou sobre a possibilidade de ter um primo trans! O que mais poderia ter escondido?

Esse tipo de questionamento sempre a levava a um verdadeiro labirinto de outras questões interligadas, por exemplo, teria Mariana contado às esposas todo o seu passado de farras, cada detalhe e cada pormenor? Patrícia e Tatiana sabiam do que tinha rolado entre elas duas? O que será que as esposas achavam de tudo isso? Nessas horas queria ser uma mosquinha, só para conseguir descobrir a opinião de cada uma sobre esses assuntos tão espinhosos. Também tinha vontade de saber como elas eram, na intimidade de trisal.

 Distante com seus pensamentos, Andreia acompanhou do salão uma movimentação repentina na entrada do restaurante, quando outra publicitária da Rubi começou a discutir com uma cliente, que pareceu chegar junto com ela. Puxando na memória, Andreia se recordou de que aquela era Bruna, uma amiga de Tatiana e Patrícia, mas num primeiro momento não entendeu o que a levava a bater boca com Miriá, ali na recepção. As duas pareciam sempre tão posudas e elegantes! Andreia até se aproximou, só para ouvir.

– Pois “com licença” digo eu, que cheguei aqui primeiro – Miriá fala, com a voz alterada, mas sem perder a classe.

– Passou primeiro pela porta, quem chegou ao balcão primeiro fui eu – Bruna rebate, impassível, sem tirar os óculos escuros.

 A cena fez Andreia se lembrar que Célia, que era casada com Bruna, também andava sumida do restaurante nos últimos tempos. Figurinha carimbada nos happy hours de sexta-feira, a amante de Miriá não tinha nem comparecido ao baile de máscaras da agência, ocasião em que a publicitária foi até homenageada. Teria Bruna finalmente descoberto a infidelidade da esposa? Andreia esperava que sim, afinal, na primeira noite em que bateu o olho nas duas percebeu que Miriá e Célia tinham um caso. Delas emanava uma tensão sexual muito perceptível, de longe logo se via.

Olhando agora as duas, frente a frente no saguão dO Bistrô, Andreia automaticamente as comparou. Claro!, esposa e amante no mesmo ambiente, numa discussão acalorada, boba é quem perde uma oportunidade dessas para analisar, conjecturar. E ao contrário do que se possa imaginar, Bruna não era uma versão amadurecida de Miriá, que parecia inteligente demais para ser apenas um brinquedo sexual nas mãos de Célia.

  A confusão/barraco não durou muito porque Elias, o primo de Mariana, se colocou entre as duas mulheres raivosas, que ao afinarem em suas devidas composturas mostraram que de comum só tinham mesmo alguém que não valia nem uma gota da saliva gasta naquela discussão. Tem gente que parece que gosta mesmo do que não presta!

 A esta altura, o salão estava praticamente lotado e o acaso fez as duas bocudas ficarem bem perto uma da outra. Ou quase isso, porque ao ver a proximidade das mesas, Bruna se recusou a se sentar.

 Inesperadamente, quem resolveu o começo de conflito e o aparente confronto foi Tatiana, que surgiu no restaurante de repente, com uma roupa parecida com a que Patrícia vestia mais cedo. Andreia se distraiu pensando na dinâmica do guarda-roupa de um trisal, mas logo se aprumou, vendo a verdadeira dona do restaurante acompanhar a amiga e o primo da esposa até o bar. No caminho, parou em dois momentos para cumprimentar pessoas que falavam com ela.

 Enquanto anotava os pedidos das publicitárias (no fim, Miriá era a companhia atrasada de Preta), Andreia se manteve de olho na movimentação nos fundos sob o pretexto de fiscalizar a bartender, mas na verdade queria mesmo era ver se Bruna e Elias tinham combinado de almoçar juntos ou se uma coincidência disfarçada de discussão os levou a sentarem-se lado a lado. A esposa traída de Célia estava tendo um caso com o primo de Mariana ou era só impressão?

– O que aconteceu, você se perdeu no caminho? Que demora, Miriá – Preta reclama, enquanto Andreia repassava os pedidos para a cozinha, pelo tablet (ideia de Mariana, que aboliu os pedidos de papel e implantou os digitais). A garçonete se afastou um passo para trás, para dar privacidade, mas se manteve perto o suficiente para escutá-las.

– Desculpe, tive que parar para atender uma ligação – Miriá se justifica, num tom de voz igualmente baixo – Mas juro que teria deixado cair na caixa postal se soubesse que esse pequeno contratempo me faria encontrar com essa mulher logo na entrada... Coisa indigesta!

 Andreia não conseguiu ouvir o resto da conversa porque o almoço conseguia ser mais trabalhoso que o jantar, como se durante o dia as pessoas tivessem mais fome e, consequentemente, mais pressa em serem atendidas.  Por causa disso, o trabalho a distraiu. Mas tentou se manter atenta às mulheres, que conversavam o tempo todo baixinho, bem confidentes. A distância, quase pareciam um casal, inclusive porque se tocavam bastante enquanto conversavam. E ornavam juntas, combinavam, mas dada a discussão de instantes atrás, Andreia desconfiou que Célia e Miriá talvez ainda pudessem se encontrar às escondidas. Ficou pensando que só um relacionamento aberto faria Preta se encaixar naquela equação sapatão.

– Não, quando essa moça estiver aqui no restaurante você precisa acomodar a Bruna bem longe dela, o mais distante possível, Zezé – Tatiana passou séria, falando com a gerente. 

Ao contrário de como habitualmente ficava enquanto permanecia por ali, hoje a mulher de Patrícia não estava com a proteção na cabeça e seus cabelos soltos conseguiram deixar a impressão de que ela era ainda mais dona daquele lugar. Passou desfilando por entre as mesas, repassando coordenadas que, aparentemente, Zezé já deveria saber. 

Tatiana não era a mais bonita das três, mas certamente era a mais gentil e, assim como a chef, tinha no rosto uma aparência sincera de extremo cansaço, como se estivesse sem dormir direito há várias noites. Ao passar por ela, viu que com os olhos fundos relatava para alguém perto do caixa como tinha atravessado a cidade depois da última aula, rápida o suficiente para chegar durante o almoço, mas ao custo de duas ou três multas por excesso de velocidade. Foi assim que Andreia se lembrou de que Tatiana era professora de Artes, além de comandante dO Bistrô e esposa de duas. Aí se viu analisando três mulheres tão diferentes, enlaçadas num mesmo matrimônio. Achou que as TPM mereciam virar objeto de estudo!

E ainda que visivelmente cansada, Tatiana teve o rosto inteiramente transformado quando lá da frente viu a esposa deixar os fundos do restaurante. Ao ver Patrícia caminhar decidida em sua direção, só desanuviou a expressão de satisfação quando a mulher se aproximou e ela então cerrou o cenho, como se estivesse zangada.  

– Que bom te ver aqui – a chef diz, após um selinho discreto – Grata por ter vindo, Tati! Cadê a Mari?

– Não sei, achei que já estivesse por aqui – Tatiana responde, puxando o celular e discando um número. Voltou a falar quando a ligação foi atendida – Oi, amor, cadê você? Já cheguei, uhum... – ela diz, se afastando com a chef a caminho do escritório lá em cima. 

– O que foi que rolou, hein? – Andreia pergunta para Zezé, apontando com a cabeça para Miriá e Preta, que tomavam um cafezinho sem muita pressa, conversando despreocupadamente.

– Naquele dia do baile, a Bruna intimou essa tal de Miriá – Zezé revela, sem delongas, quase cochichando – Apareceu vestida da forma que a esposa viria e contou que a Célia tinha um caso com a assistente dela. 

– Uau! – Andreia exclama, com as sobrancelhas arqueadas. Ela não esperava por essa resposta, que imediatamente destravou novas perguntas – E aí se separaram? 

– No mesmo dia – Zezé dá uma risadinha, parecendo satisfeita com o desfecho desta história – Além do casamento, parece que a Célia também perdeu o emprego. Dona Bruna fez as malas dela e a colocou para fora de casa, no olho da rua.

– Eita, que delícia – Andreia ri também – E por que brigaram agora há pouco? – a garçonete volta a apontar com a cabeça na direção de Preta e Miriá, que riam de algo. Mais ao fundo dava para ver Bruna e Elias, perto do balcão do bar, sentados próximos.

– Vai saber! Acho que agora vão brigar sempre que se encontrarem – Zezé dá de ombros – Uma bobagem... pelo que ouvi, a tal da Célia até já está com outra.  

– Sério? Que rápida...

– Achei também. Parece que ela já se envolveu com uma ricaça norte-americana, também do ramo de hotéis. Está lá em Nova Iorque.

– Que sorte a dela... – Andreia resmunga, com desdém – E esses dois agora têm um caso? – ela aponta para onde estavam Bruna e Elias.

– Não sei. Parece, né? E elas também – Zezé indica Miriá e Preta com o olhar. As mulheres estavam de mãos dadas, com os dedos entrelaçados uns nos outros. 

– Todo mundo se dando bem, menos nosso trisal de estimação... – Andreia comenta, em tom de zombaria.

– É, elas três também brigaram no dia do baile – Zezé diz, emendando uma tosse logo após o comentário. Pareceu falar sem pensar.

– Teve a ver com o apagão? O Pedro me contou que a Mariana insistiu em sair para buscar um transformador na rua, aí voltou quando a festa já estava rolando e com o carro batido. Eu não vi nada disso, mas vi que não foi usado gerador nenhum, foram vários minutos de breu.

– É, e depois a Mariana ainda enfiou na festa a mulher em quem bateu e a namorada dela...

Aquela mulher ali, né? – Andreia aponta para Mayara, que acabava de entrar no restaurante.

– Nossa, ela mesma! Que coincidência!

 Andreia se afastou da gerente por um instante e acompanhou Mayara até uma mesa disponível, no momento em que Preta e Miriá se levantavam para ir embora. Com o corpo, protegeu para que as duas saíssem sem que Bruna, lá no fundo, reparasse na saída delas. 

– Boa tarde, grata – Mayara agradece, se acomodando próximo à parede – Minha namorada está um pouco atrasada, será que posso pedir um café enquanto a espero?

– Claro, prefere espresso ou coado, normal? 

– O que for mais fácil. E o que me dê mais coragem. Pretendo pedi-la em casamento durante o almoço.

– Ah, que legal – Andreia sorri, enviando o pedido para a cozinha – Vou trazer um duplo para você, especial – complementa, se afastando para buscar o café. 

– Mais tarde você me busca? – Bruna pergunta para Elias, no momento em que Andreia passa ao lado deles, perto do bar – Como fazemos para nos encontrar à noite?

– Eu te pego na sua casa, sim – Elias diz. 

Ele dá um beijo na mão da mulher, cheio de galanteios, caminhando ao lado dela em direção à saída. Apoiando o braço em cima de seus ombros, disse mais alguma coisa que fez Bruna rir, ruborizada, mas de longe Andreia não conseguiu escutar. Voltou para o salão equilibrando o café da cliente em uma mão, vendo o casal caminhar abraçado lá fora, na calçada. 

 O flagrante de intimidade deixou claro que estavam tendo um caso. Ou começando um! Constatar isso a fez buscar por Zezé pelo salão, para ver se ela também tinha flagrado tudo aquilo, mas ao varrer o lugar com os olhos Andreia encontrou foi Mariana, parada perto da porta, falando ao celular. Ainda que parecesse distraída, sorriu para Mayara ao vê-la por ali, a cumprimentando com um aceno rápido com a mão e um sorriso de canto.

 Sempre muito sociável, Mariana era conhecida de muita gente, mas estranhamente só Andreia se incomodava com o fato de ela estar casada com duas mulheres. Talvez sua irmã tivesse razão e Mariana fosse mesmo sua atual obsessão. Por isso até a stalkeava com um perfil fake, embora isso gerasse mais frustrações do que expectativas. Nem nos stories Mariana entregava seus segredos ou particularidades.

E aquilo parecia maior do que ela; Andreia simplesmente se comia de curiosidade quando o assunto era a ex. Se esforçava para entender o que havia mudado nela, ao ponto de fazê-la ir contra o que sempre tinha afirmado, pelos quatro cantos do mundo. E mais, porque também adoraria também entender como Mariana atualmente conseguia o feito de ser fiel às esposas. Até onde sabia, Patrícia e Tatiana jamais haviam experimentado a decepção de serem traídas por ela. De repente Mariana parecia ter apenas olhos para as duas, como se simplesmente não existisse mais ninguém no planeta inteiro.

 Que feitiço é esse, capaz de mudar tanto alguém assim? Andreia desconfiava que tinha alguma relação com o chá que lhe serviam, porque só o amor, pura e simplesmente, parecia pouco e insuficiente para tanto. Ainda mais no caso de Mariana, tão intensa e descomprometida, descompromissada, desprovida desde sempre de qualquer maturidade ou inteligência emocional. Certamente ser marmita de casal combinava com ela, que era uma depravada quando o assunto era sexo. Não que Andreia reclamasse disso na época em que saíam, mas é fato que essa informação, hoje, tinha um peso completamente diferente. E o ciúmes por alguém com quem não tinha absolutamente nada, nenhum relacionamento, a corroía de um jeito descabido e doloroso.

 A olhando ali, parada na porta, parecendo irritada com seu interlocutor do outro lado da linha, Andreia admitiu que a mulher era linda. Estava ainda mais bonita do que quando se conheceram, na época em que Mariana usava aparelho nos dentes e trabalhava com telemarketing, na República. Andreia sabia que agora ela tinha a sua própria empresa, acessou várias vezes o site dela, até seguia o Twitter da firma, e com o perfil verdadeiro!, só para ficar por dentro do que acontecia em sua vida. Por exemplo, informações sobre novos clientes, os contratos que ela fechava, o que fosse. Nisso sua rotina incluía vasculhar o perfil de uma funcionária dela, pois Nicole eventualmente postava algum story com Mariana. Depois, Andreia visitava os lugares onde elas tinham se encontrado e pedia até um café igual.

Mas o melhor mesmo era isso: poder observá-la em seu dia a dia, distraída, como era característico de Mariana. Era perfeito até que uma das esposas entrassem em cena, e desta vez apareceram logo as duas. Patrícia e Tatiana desceram juntas do escritório, como se tivessem pressentido a chegada de Mariana, que permanecia no telefone.

Talvez, se Tatiana não estivesse tão ausente nos últimos dias, Andreia teria reparado antes que ela e Patrícia estavam “de mal”. Isso era nítido de longe, o corpo fala muito nessas horas e o de Tatiana estava todo contrário ao de Patrícia, parada perto dela, como se a repelisse (cotovelos apontados em sua direção, na defensiva, joelhos e pés no sentido oposto, como se quisessem fugir). Curioso porque mais cedo a olhada de Tatiana para a esposa atravessando o salão dO Bistrô fez Andreia acreditar que as duas ainda se amavam muito! Não se olha daquele jeito para alguém que não se gosta.

Olhando o trisal agora, foi possível constatar que Mariana atuava como uma espécie de elo para o casal original, que notadamente não estava bem e que nitidamente não era por algo provocado por ela. Inclusive, se fosse para dar um palpite, Andreia diria que Patrícia em algum momento recente cometeu algum vacilo que chateou Tatiana. Mariana até podia ter se aborrecido também, mas já tinha perdoado, porque ela era dessas. E porque sua postura não estava nada combativa (a julgar pelo caimento de seus braços, estava era preocupada com alguma coisa).

Ela permanecia ocupada no celular e, embora Patrícia e Tatiana conversassem algo perto dela, extremamente baixo, a primeira imediatamente cruzou os dedos nos de Mariana enquanto a segunda a tocou, arrumando o pingente que ficava pendurado na correntinha de ouro que usava no pescoço. Nenhum dos gestos foi interrompido; ao contrário, ela facilmente cedeu a ambos.

Quando Zezé ressurgiu no salão, Andreia disfarçou e fingiu estar trabalhando, mas se manteve de olho porque ao encerrar a ligação, Mariana se virou enquanto falava algo para as esposas e seu semblante estava carregado, bem diferente de como estava de manhã. Gente, alguém põe esse trisal para dormir, por favor!

– Zezé, cuida de tudo aqui por favor, nós vamos até o hospital porque parece que a visita só pode ser feita durante o período do almoço – Tatiana diz. Patrícia, ao fundo, já estava sem a vestimenta de cozinha e falava algo com Mariana. As duas ainda estavam de mãos dadas porque Mariana era muito reconciliadora ou realmente amava muito Patrícia – A Pati conversou mais cedo com a mãe do Pedro, combinou tudo com ela, a gente vai até lá e já volta.  

– Tá, mas e a cozinha? Como fica? – Andreia ouviu Zezé perguntar, num tom preocupado, embora baixo – O salão está cheio, a gente tem reserva e...

– O pessoal da cozinha está avisado, eles cuidam de tudo. E você estará aqui também, caso aconteça algo emergencial ou urgente – Tatiana sorri, tentando transmitir confiança. 

– Olha, por essa eu não esperava... – Andreia diz, quando as três partem no carro dirigido por Mariana. O carro novo porque o antigo, aquele que ela morria de apego, foi vendido já faz um tempo – Dona Patrícia largando o posto no meio do almoço...

– É, nem eu estava esperando – Zezé revela. Parecia, porém, mais satisfeita do que preocupada – Mas fico feliz. Se fosse eu a estar agora num hospital, ia gostar de me deparar com a Patrícia me visitando em pleno horário de pico.

– Sim, mas é um baita de um desprendimento também, convenhamos – Andreia retruca – O quê? É verdade, ué, somos regidas pelas leis do capitalismo, “tempo é dinheiro”.

– Pode até ser e fico satisfeita, mais ainda, porque mesmo assim a Patrícia largou tudo para ir visitar alguém do nosso time. Isso diz muito da índole dela, uma pena que tenha se envolvido justamente com essa mau-caráter...

– É, mas não chega a tanto... – Andreia se ouviu resmungar. Foi incontrolável, até porque, bem ou mal, Mariana também tinha largado tudo no meio do dia para ir até o hospital onde Pedro estava. E ela nem trabalhava nO Bistrô!

– Ué, você é que fala que ela foi carrasca na sua história, e não sei o que, não sei o que lá... – Zezé rebate, sem dizer nada especificamente, listando nos dedos vários itens imaginários – Mas vai lá, olha lá a cliente te chamando – ela emenda, porque embora fosse curiosa, era profissional em primeiro lugar.

– Oi, desculpa – Mayara diz, um pouco encabulada – Minha namorada ainda vai demorar, não atendeu minhas ligações... Eu gostaria de outro café, por favor.

– Claro, agora mesmo – Andreia responde, enviando o pedido para a cozinha – Ouvi dizer que está bastante trânsito ali pelo centro, por causa de uma obra... Pode ser que tenha afetado o itinerário dela por isso se atrasou – complementa, tentando consolar.

– É, não acho que seja por isso... Desconfio que ela tenha ido trabalhar, embora hoje estivesse de folga. Deve ter esquecido de me avisar, ou esqueceu que marcamos de almoçar.

– Ah... – Andreia resmunga e se afasta, porque não teve mais nada a dizer. Foi buscar o café para que isso a consolasse de verdade.

– Grata, gosto bastante desse café – Mayara diz, assoprando a borda da xícara antes de bebericar.

– É, o café daqui é uma delícia. A esposa da chef mandou importar a máquina lá da Itália – Andreia fala, confortável para fazer o comentário com Mayara, que notadamente não era hétero.

– A Mariana? Ela me disse mesmo que era viciada em café.

– Não, não. Isso é obra da Tatiana – Andreia explica – A outra esposa. A primeira, quer dizer – ela se corrige.

– Ah, sim. Essa não conheço ainda, só a chef – Mayara dá um sorriso breve, bebendo mais um golinho depois de assoprar.

– Fica à vontade, tá? Qualquer coisa é só me chamar – a garçonete diz, afastando-se.

– Essa cliente já almoçou? Não a vi comendo nada e ela já está no cafezinho – Zezé comenta, tão logo Andreia volta a se aproximar. A aguardava parada no mesmo lugar, para darem continuidade ao assunto.

– Não, ela disse que está esperando a namorada para almoçarem juntas. Pelo jeito, depois do acidente de trânsito ela e a Mariana viraram amigas! Sabe até que a Mariana gosta de café...

– Ah, mas não precisa ser muito íntimo dela para saber disso, né, cá entre nós – Zezé ri – Mariana, a “mau-caráter que ‘não chega a tanto’” – ela ri de novo, numa clara provocação. 

– Ai, Zezé, tá bom, vai. Vou te contar o que aconteceu e aí você faz seus próprios julgamentos.

– Claro, eu os farei, não se preocupe com isso – Zezé sorria, satisfeita por antecipação.

– Na época em que nós duas saíamos, a Mariana me traiu. Eu descobri, fui atrás dela, intimei... Mas aí ela alegou que nós não tínhamos nada sério, ou monogâmico, ou exclusivo, e que por isso não havia nada de errado. Mas me traiu mesmo assim.

– Certo – Zezé diz, esperando por mais. Com certeza havia mais!

– Ela me traiu com a Pri.

– Pri, Priscila? Pera, como assim? A Mariana te traiu com a sua irmã? É isso? – a pergunta de Zezé veio acompanhada pela expressão de espanto que Andreia aguardava ver em seu rosto – Como que ela não é mau-caráter, Andreia? É vilã, sim!

– Ah, ela jurou de pés juntos que não sabia do nosso parentesco... – Andreia argumenta, sem muito entusiasmo na defesa que fazia – Insistiu que nós não tínhamos nada, alegou que nem queria ter, nem com a Pri, se desculpou pelo ocorrido e seguiu com a vida. Um tempo depois reapareceu aqui no restaurante já como esposa da Patrícia. E da Tatiana.

– E você acha que...

– Minha irmã diz que ela virou minha obsessão – Andreia a interrompe, antes que Zezé terminasse a pergunta – A Priscila diz que a Mariana se transformou no escape para onde automaticamente escorrem todas as minhas frustrações. E acho que ela tem razão, sabia? Me viciei nisso, acho... 

– Mas... – agora é Zezé quem se interrompe – Ai, cliente chamando...

– Oi, pode fechar a conta, por favor? – Mayara pede, com os olhos marejados – Minha namor... Ela... ela não vem.

 Andreia puxa o celular que Mayara empurra em sua direção e na tela lê a mensagem de alguém que assinou como “Taís.”. Assim mesmo, bem seca e terminativa, com ponto no final. A mensagem tinha menos de dez linhas e dizia: “Mayara, me desculpe, mas não posso. Não posso te encontrar para almoçar e nem continuar com esse relacionamento. Sinto que preciso focar em mim, na minha carreira, no meu trabalho, que me consome demais. Me desculpe, não é nada com você, eu é que estou em outro momento. Espero que me entenda. Taís.”. 

  

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