3xTPM - A festa
Essa é a última história da segunda temporada da Novelinha <3
Se ainda não leu a nona, "A outra", clique aqui.
Sabemos que o tempo é um sujeito bastante justo e democrático, e que
passa de maneira igual para todas, mas quando acontece de estarmos mais
ansiosas, a percepção muda. Em outras palavras, os minutos podem passar mais ou
menos rápido conforme a nossa urgência, mas ainda assim não excedendo os 1440
diários, cronometrados por todos os relógios do mundo, eternos fiscais do
passar das horas.
Na rotina do trisal Tatiana, Patrícia e Mariana, por exemplo,
invariavelmente acontece de o tempo sofrer algum tipo de alteração. Isso se dá
quando uma está mais ansiosa que as demais, por motivos que variam conforme as
estações do ano se apresentam e que vão se revezando ao longo do tempo,
seguindo a maré típica dos ciclos hormonais. O equilíbrio para desfrutarem de
um relacionamento saudável é possível graças à sorte de, em geral, haver sempre
uma ausência de ansiedade generalizada dentro de casa. Ou seja, diante da
agitação excessiva de uma, há a calmaria das outras duas como contraponto. Funcionou
bem até aqui.
Se fôssemos classificá-las numa escala de estresse, Patrícia apareceria
sozinha no topo, pois em disparada é a mais carregada, absorve muito mal as
coisas, tem sérios problemas para digerir. Tatiana surgiria na sequência
ocupando a posição intermediária, porque embora seja tranquila na maior parte
dos dias, tem lá seus momentos de desventura e de vez em quando também sai dos
eixos. Mariana, por sua vez, viveria tranquila numa rede, na base da pirâmide,
por ser de longe a mais imperturbada das três.
Então, quando acontece de por acaso escaparem da proporção uma por duas,
ou melhor, quando as mais velhas ficam agitadas simultaneamente (e é comum
Tatiana se aborrecer com Patrícia, ou vice-versa, e ficam as duas meio
viradas), a mais nova é quem ameniza as tensões. E Mariana tem um jeitinho todo
próprio para hastear as bandeiras da paz e reestabelecer a harmonia em seu lar.
Agora, quando acontece de ela se pilhar também ou, pior ainda, nas vezes
em que coincide de as TPM ficarem atacadas ao mesmo tempo, aí é uma situação
muito mais complicada e difícil de se administrar. É raro, mas perfeitamente
possível de ocorrer.
Verdade seja dita, no geral Mariana pouco se abala com os fatos da vida;
mesmo diante das constantes adversidades que enfrenta, advindas principalmente
do trabalho, ela vive com o semblante sereno e tranquilo. Nem o trânsito
consegue afetá-la, que é o que em geral tira Tatiana do sério, ao ponto de
estragar seu dia. Patrícia, por este motivo, até evita dirigir porque ela, sim,
fica realmente transtornada atrás do volante. Motorista de pavio curto, se
transforma dentro do carro; se aborrece e xinga o caminho inteiro, a mão
enfiada na buzina o tempo todo. Não por acaso, Mariana rapidamente virou a
condutora oficial, só deixando de levá-las quando porventura perde os óculos –
e ela costuma perdê-los com frequência.
Mas ainda que seja pacífica, há casos em que até Mariana sai do sério,
afinal ninguém tem sangue de barata. Inclusive, as poucas discussões sérias que
as três tiveram foi quando ela estava fora do seu normal, aí desceram juntas a
ladeira da destemperança. Foi assim que ficou claro o papel que exercia no
relacionamento e a importância de seu estado de espírito e de nervos para
mantê-las o máximo a salvo, dentro do possível. Especialmente diante de grandes
eventos, como o do próximo fim de semana, nO Bistrô.
Como era esperado, Patrícia andava agitada nos últimos dias, com o sono
mal dormido. Isso sempre prejudicava as noites de Tatiana, que deitava do outro
lado da cama e mesmo assim acordava azeda por não ter descansado direito. Essa
situação resultou em mulheres extenuadas antes mesmo que o evento sequer
tivesse começado.
– Finalmente é
sábado – Patrícia diz, sentando na cama antes de o dia clarear. O tom de suas
palavras revelou como tinha sido sua noite.
Foram quase três meses de conversas, planejamento e muita organização.
Várias semanas discutindo e definindo o cardápio, as entradas, as bebidas a
serem servidas na festa, a disposição das mesas, a separação dos ambientes, a decoração
dos espaços. Nos dias finais que antecederam o grande evento, a cozinha dO
Bistrô praticamente se dividiu em duas, com os funcionários se revezando entre
o trabalho cotidiano, a pleno vapor, e os preparativos para a montagem final e
prova dos pratos, elaborados especialmente para a comemoração dos 50 anos da
Agência Rubi.
Pela primeira vez desde a inauguração, O Bistrô ficaria fechado para o
público em pleno sábado, seu dia de maior movimento, exclusivamente para sediar
o evento, reservado e restrito a uma lista de presença, com ampla cobertura da
mídia. Importantes nomes de diversas áreas eram esperados, o que fez Patrícia e
sua equipe trabalharem dobrado. A chef sabia que receberiam quase tanto
destaque quanto a comemoração em questão. Bem ou mal, ela e seu restaurante
faziam parte da festa.
Se tinha uma coisa que havia aprendido nos últimos anos à frente dO
Bistrô é que marketing é um ingrediente importante para o sucesso de qualquer
negócio. Que precisa estar obviamente bem alicerçado, mas com uma boa
propaganda se vai sempre muito mais longe. Política, a chef percebeu logo de
cara a oportunidade de ouro que tinha em mãos, sediando a festa de aniversário
de uma das agências de publicidade mais famosas do Brasil. Tratava-se de uma
oportunidade perfeita para apresentar o trabalho de sua equipe e era também uma
excelente divulgação dO Bistrô, além de gratuita e espontânea. E rentável, pois
tinha fechado um bom negócio locando o espaço e fechando a noite só para os
convidados da agência. Não fazia parte de seus planos, mas o valor dava para
investir numa expansão do restaurante, caso pretendesse. Mas ela não pensava em
nada disso porque, de sua parte, até aqui houve só um excessivo gasto de
energia, a impedindo de focar em qualquer outra questão que não fosse a festa.
– Ah, vem cá,
minha gatinha... não levanta ainda não, Pati – Mariana pede, com a voz
carregada de sono, enroscando um braço na cintura da esposa, sentada na beira
da cama, só com um pé no chão.
O pedido fez o corpo de Patrícia automaticamente amolecer, como acontecia
sempre que Mariana falava daquele jeito. Ela foi se virando e deitando devagar,
voltando para a cama quase em câmera lenta, seu corpo todo em contraste com as
palavras que dizia.
– Não posso, meu
amor... – Patrícia fala, num tom ainda mais baixo, se deitando de frente para a
esposa. A mão direita alisou seu cabelo, indo parar na nuca, que ela puxou,
para um beijo de bom dia, demorado e molhado. Mariana a abraçou de olhos
fechados e gemeu baixinho, encostando seus corpos até os pés, puxando a cintura
dela para mais perto da sua. Enfiou uma das mãos embaixo do pijama de algodão
de Patrícia, alisando suas costas enquanto se beijavam, um beijo que serviu
para deixar ambas com a respiração mais curta – Hoje vai ser um dia tão cheio...
– Patrícia continuou, ao se afastarem alguns milímetros.
– Vai – Mariana
beija seu pescoço, da base, desde o ombro, até em cima, perto do queixo,
roçando os dentes pelo caminho, puxando a camisa do pijama dela para cima
depois de lamber sua boca, a beijando mais uma vez. Alisou a lateral desnuda do
seio da mulher, que se moldava ao seu toque, o corpo todo se rendendo a ela. O
beijo agora foi mais acelerado, combinando com o gemido que Patrícia deixou
escapar sem querer, acordando a terceira mulher – Vai mesmo ser um dia muito,
muito cheio – Mariana geme de novo quando Tatiana, já bem desperta atrás dela,
levanta seu cabelo num movimento rápido e cheira seu pescoço. Tirou sua
calcinha na sequência, sem dizer nada e esfregou o quadril na bunda dela, as mãos
apertando a parte traseira de suas coxas, para se encaixarem melhor –
Precisamos de uma dose extra de energia para aguentarmos – Mariana continua,
com uma risada, já nua entre as duas, após ela mesma tirar a camiseta do pijama
– Né?, para ficarmos bem dispostinhas...
Mariana se virou um pouco para
beijar Tatiana atrás dela. A mulher mantinha as pontas dos dedos pressionando
sua pele, numa pegada meio urgente que esquentava o corpo inteiro. O tecido
fino de seu short maldosamente impedia que se tocassem como desejavam, e por
isso Tatiana se despiu da cintura para baixo, empurrando o final do pijama com
o pé, parecendo impaciente, sem desunir suas bocas. O beijo dela era diferente,
deixava Mariana excitada, com vontade de dar tudo o que Tatiana quisesse. E a
mulher sabia do poder que exercia e por isso a apertou mais forte ao se
beijarem, abrindo os olhos só para contemplar Patrícia lamber e sugar o mamilo
eriçado de Mariana, com vontade, suas mãos a alcançando na altura do cóccix. As
duas trocaram um olhar breve, cúmplice, que se emendou num sorriso safado.
– Bom dia, meu amor – Tatiana cumprimenta
Patrícia, erguendo-se por cima de uma ofegante Mariana para poder beijá-la
também. Tinha os olhos em brasa, cheios de tesão, e o cabelo despenteado de
sono complementava bem o conjunto. Estava linda naquela penumbra sexy.
– Bom dia, vida
– Patrícia termina de tirar a blusa de Tatiana no meio do beijo. Mariana, mais
embaixo, no meio das duas, se deliciava passando a língua onde alcançava
enquanto elas se movimentavam, se livrando das peças remanescentes de roupa.
Ainda estava com o corpo virado na direção de Patrícia e esfregava a bunda no
púbis de Tatiana, sentindo os pelos da mulher acariciarem sua carne, de um
jeito provocativo. Ao fazer menção de se levantar foi contida por Patrícia, que
a manteve presa no colchão, a beijando de novo, mais uma vez fazendo Mariana
gemer ao segurá-la pela nuca.
– Nós vamos
trabalhar juntas hoje – Tatiana diz, se referindo ao restaurante, mas seu
comentário soou sexual. Passou nua por cima das duas, voltando a se enfiar
debaixo do edredom às costas de Patrícia, a prensando no meio delas. Puxou
Mariana com o braço, enlaçando as três num abraço quente e apertado, e suspirou
satisfeita vendo Patrícia e Mariana se beijarem de novo.
Tatiana desta vez desnudou a
parte de trás do pescoço de Patrícia, os pelos se eriçando só de sentir sua
presença ali. Então cheirou sua nuca profundamente, a respiração fazendo até um
som de satisfação, emendando outra fungada, mais demorada, acompanhada de um
gemido curto.
Com um pouco menos de cuidado, segurou o cabelo da esposa com uma das
mãos, a outra a erguendo mais abaixo, no começo da bunda, deslocando seu corpo
alguns centímetros para cima. Patrícia pareceu gostar porque gemeu mais alto e
a puxou pela cintura, o braço dando a volta para trás para segurá-la, com
firmeza. Esfregou a bunda nela, quase repetindo o movimento feito instantes
antes por Mariana.
Com o cabelo de Patrícia preso entre os dedos, Tatiana mordiscou seu
pescoço, bem próxima de Mariana, que mais à frente passava a língua pelo colo
da esposa, passeando com a boca pelo corpo cheiroso da mulher, que se contorcia
por vários motivos.
– Eu amo
trabalhar juntas, com vocês – Mariana geme, se esfregando de levinho na coxa de
Patrícia, que a segurou por trás, a puxando para que ela se encaixasse ali, as
virilhas se encostando, suas pernas se trançando naturalmente. As mãos em sua
cintura determinaram o ritmo que queria que ela rebolasse e Mariana a atendeu
de prontidão. Sustentaram o olhar, dizendo palavras que não foram pronunciadas.
Patrícia gemeu também quando
Tatiana mordeu um pouco mais forte a parte de cima de suas costas, os dentes
encravando perto do ombro, a pele ficando vermelha quase imediatamente. Ao
ouvir sua reação a mulher a mordeu de novo, puxando mais o cabelo dela para
cima, obrigando Patrícia a baixar a guarda, ao fazê-la se amolecer e se abrir
para elas. Tatiana sorriu ao ouvir o sorriso de regozijo de Mariana, que quis
tomar posse do prazer de Patrícia, já molhada para as duas.
– Eu amo você –
Mariana diz, levando à boca os dedos embebidos do tesão de Patrícia, antes de
tocá-la mais uma vez, a beijando devagar.
– Eu te amo
também – Patrícia diz, os olhos se fechando sem querer ao sentir a mão Tatiana
se posicionar por trás, complementando as carícias de Mariana, com a habilidade
de quem conhece seu corpo há tanto tempo e tão bem – Eu te amo também – ela
repete e se vira para beijar desta vez Tatiana, deixando o pescoço livre para
Mariana, que não perdeu tempo e a lambeu em direção à orelha, sussurrando algo,
levando a mão livre para o meio das pernas de Tatiana.
Mariana tinha a expressão de
deleite que sempre estampava seu rosto quando eventualmente acolhia as esposas
daquele jeito, tão intimamente. Seus movimentos eram cadenciados pelo ritmo de
seu rebolado, sensual, encaixada nua e aberta na perna de Patrícia, que
continuava a ditar o ritmo desejado, puxando seus flancos com ambas as mãos, ao
seu bel prazer.
Patrícia tinha o olhar
pervertido e produzia um vaievém debaixo das cobertas que combinava com o
requebro da mulher à sua frente. Se esforçava para se manter bem no centro das
digitais de Mariana, na frente, e de Tatiana, por detrás dela, quase na beira
do colchão, que a tocava de um jeito provocativo, alisando com movimentos
circulares uma de suas zonas erógenas principais, seu ponto fraco mais
relevante.
Tatiana por sua vez dançava na ponta da cama no ritmo das carícias de
Mariana, que mantinha o braço meio por cima, com a mão presa entre suas pernas,
provocando calor numa área já bem aquecida. Soltou Patrícia só para puxar
Mariana para perto, num beijo que a fez gemer mais alto, sua mão segurando a
mão dela em seu cabelo, a mantendo próxima, quase presa no beijo. Patrícia se
espalmou nos seios pequenos da mulher, que pulava os olhos entre as duas, suas.
A achou tão linda e libidinosa que a forçou a rebolar um pouco mais rápido,
puxando seu quadril com mais empenho, balançando a cabeça em concordância,
provocando palavras desconexas que Mariana disse de um jeito muito excitante.
Patrícia sentia na perna o rastro úmido que Mariana ia deixando, na
cadência de seus movimentos, os olhos quase virando de órbita de tanto tesão.
Seu rosto denunciava o prazer inundar todo o seu corpo, quase paralisando os
sentidos, concentrando-os num único ponto. Ao se movimentar para a frente,
Mariana pressionava a mão em seu grelo, que deslizava, todo molhado e inchado.
Para não perdê-lo, ao se afastar brevemente para trás, em partes seguindo o
ritmo que Patrícia orquestrava, ela o prendia entre dois dedos, numa pressão
leve que fazia a esposa ameaçar de dizer algo, mas ela só abria e fechava a
boca, soltando sons que não falavam nada, exatamente.
As três gemiam por motivos idênticos, mas complementares, e o som ia
desencadeando novos murmúrios que se emendavam a outros, numa melodia conhecida
e ofegante que ia subindo de nota a cada novo tom. O tipo de coisa que fica
depois no fundo da memória, e que quando vem à tona faz a gente até suspirar.
Patrícia sentia às suas costas a respiração pesada de Tatiana, do jeito
que ficava já perto de ela gozar, os pelos curtos roçando em sua bunda, a
esposa literalmente na palma da mão de Mariana. Ela se comprimia toda contra o
seu corpo, os dentes hora ou outra a marcando de levinho, em consonância com a
pressão que sentia entre as pernas. Os sons que saíam do fundo da garganta de
Tatiana, com sua voz meio rouca, atiçavam desde sempre todos os seus instintos,
provocando desejos que Patrícia tentava saciar também com Mariana, que
esfregava o corpo inteiro nela, à sua frente, num tesão bem explícito, como era
de costume.
Mariana se entregava integralmente, jamais economizando o prazer sincero
que sentia por transar com suas esposas. Achava satisfatório demais fazer parte
daquele trisal! Aplaudia internamente sempre que Tatiana e Patrícia se pegavam,
as achava um tesão, mas ficavam ainda mais gostosas quando se enroscavam junto
com ela, num sexo que, diziam as duas, nunca foi igual.
De longe, era a mais sexual das três e seu comportamento despudorado
ajudou a apimentar a relação de Patrícia e Tatiana, já acostumadas àquela coisa
mais calma e tranquila, comum das relações antigas. Com o novo tempero ganharam
quase um novo fôlego, e parecia que agora se sentiam até mais dispostas,
renovando a ligação delas de uma maneira muito interessante, numa dinâmica mais
do que bem-vinda. Mariana tinha um apetite sexual quase insaciável, seu tesão
ia meio que se renovando a cada orgasmo e, se não se cuidassem, perigava de
ficarem horas transando. Geralmente era o que faziam nos domingos livres, aí
terminavam o único dia de descanso exaustas. Não dava para ser diferente,
sempre perdiam um pouco a noção do tempo nessas horas.
Agora mesmo não pareciam se importar com o horário, com os minutos que
avançavam ligeiros, nem com os compromissos que lotariam o dia com milhares de
afazeres, quase infinitos, até sabe-se lá que horas. Naquele momento nada mais
além delas importava e as três permaneceram deitadas, enroscadas, sem pressa de
se sentirem, de se curtirem, de se amarem.
Como sempre Mariana foi a primeira a gozar, desencadeando com seus
gemidos prolongados os outros orgasmos num efeito em cascata: primeiro
Patrícia, depois Tatiana, quase ao mesmo tempo. Ela puxou a mão de alguém, sem
pensar direito e sem muito critério, inserindo dois dedos de Patrícia dentro
dela. Se contraiu o máximo que conseguiu, segurando a mulher ali, presa nos
galopes que ainda eram sentidos do primeiro orgasmo. O segundo veio quando
Tatiana a beijou e Patrícia fez o movimento para a esposa atingir o clímax mais
uma vez.
– Gostosa demais
– Tatiana diz, tirando a franja suada da frente dos olhos de Mariana, que
piscava lentamente.
– Amo vocês – Patrícia
se declara, as beijando agora num ritmo mais devagar, em contraste com sua
respiração, acelerada.
– A gente vai
ter que se pegar de novo, mais tarde na festa – Mariana complementa, provocando
uma reação imediata das duas.
– Ó as ideias –
Patrícia ri, dando um selinho nelas antes de se levantar. Puxou a camisa do
pijama, mas não vestiu.
– Só você mesmo,
Mari – Tatiana ri também, a beijando de maneira mais demorada, abraçando o
corpo suado da mulher.
– Ué – Mariana
puxa a bombinha de asma debaixo do travesseiro. Quando continuou, suas palavras
tinham cheiro de Aerolin – É sério! É baile de máscaras, gente.
– Sim, uma festa
em que estaremos trabalhando. Não foi o que ela disse? – Patrícia amarra o
cabelo, parada nua no meio do quarto. Apontou com a cabeça para Tatiana, que
mandou um beijinho no ar.
– Amor, você
consegue uma pausa de meia horinha, não consegue? – Mariana deita no ombro de
Tatiana, que tinha no rosto o sorriso que Patrícia sabia bem o que significava
– Vai estar todo mundo fantasiado, até nós. Vamos nos pegar no banheiro, por
favor, eu sempre quis!
– Sempre quis no
banheiro dO Bistrô? – Tatiana estava rindo, mas para Patrícia.
– Claro! –
Mariana responde, alheia ao desejo antigo de Tatiana, nunca atendido – O
banheiro de lá é incrível, todo mundo fala! Tem uma luz ótima e aquele espelho
valoriza qualquer uma!
– Anti-higiênico
demais... – Patrícia retruca, já fora do quarto – Mas tudo bem, vou pensar no
assunto – complementa, a voz abafada pelo som do chuveiro ligado.
– Acha que ela
vai topar? – Mariana se vira na direção da esposa e beija seu pescoço.
– Não sei, sabe
como a Pati fica em dias de festa... Mas eu topo, Mari.
– Eu sei que
topa! Safada – Mariana a beija, empurrando seu corpo contra o dela.
– Você que é!
Gostosa!
Mariana senta em cima dela,
quente, o tronco todo retesado. Puxou o cabelo para o alto com as duas mãos,
dando um nó numa espécie de coque, antes de se abaixar e lamber o pescoço da
esposa. Comprimiu o quadril contra o dela, passando a língua pelo seu rosto, a
beijando na sequência. Então parou e fez um gesto com o dedo, quando o chuveiro
desligou, e tão rápido quanto subiu, se levantou.
– Ei, vem cá...
– Tatiana a chama, fazendo um pouco de manha, se esticando sozinha no colchão.
– Não, amor –
Mariana tinha um olhar travesso, mas estava séria – Hoje é um dia cheio, sabe
como a Pati fica em dias de festa... Vem, toma banho comigo – ela dá uma
piscadinha, complementando seu convite.
– Precisaríamos
de máscaras diferentes – Patrícia diz, assim que a vê entrar no banheiro. Falou
de um jeito como se estivesse apenas continuando a conversa anterior – Se vamos
transar no banheiro do restaurante, os convidados não precisam saber.
– Justo. Deixa
que eu providencio isso – Mariana a beija antes de entrar no box, abrindo a
torneira ao soltar o cabelo – Leva uma roupa diferente. Podemos fingir que
somos três completas estranhas.
– A Mari quer
pegar a gente nO Bistrô que nem ela pegava as mulherzinhas antigamente –
Patrícia comenta e Tatiana ri.
– Não me oponho
em nada quanto a isso! – ela entrou rindo no box, passando a mão na bunda de
Mariana, embaixo do chuveiro – Me pega, Mariana! Mas vê se arranja uma máscara
bonita, hein?
– Vou sim –
Mariana contrai os olhos, pegando o xampu.
– Esse é o condicionador,
gata – Tatiana entrega o frasco correto – A gente vai marcar uma hora ou o quê?
– Tem que
marcar, gente. Eu vou estar trabalhando! – Patrícia tinha um tom nervoso – Mas
quero que por favor se divirtam e aproveitem – complementou, de um jeito mais
sereno – Vai estar tudo lindo, quero que vocês desfrutem por mim.
– Eu vou
trabalhar com a Zezé – Tatiana se defende.
– Eu vou
desfrutar, com certeza! – Mariana responde, junto com ela.
– Só não inventa
de beijar a mascarada errada no meio da noite... – Patrícia pede. Foi a única
que não riu.
– Eu jamais
cometeria esse deslize – Mariana rebate, abrindo a porta de vidro do box só
para encará-la, séria.
– Deixa ela –
Tatiana fala, quando Patrícia vai para o quarto, sem dizer mais nada – A Pati
só está ansiosa com esse evento.
– Eu te conto
qual máscara vou escolher para ela – Mariana rebate, falando baixinho, em tom
confidente – Quê? É festa a fantasia, Tatiana! Vai estar escuro, ué... Não que
exista algum risco de confundi-la com outra, mas pretendo beber, sei lá... Não
quero que você também corra algum risco. A noite tem que ser perfeita, pelo
menos de nossa parte.
– Tá bom, Mari –
Tatiana sai do box rindo – Mas eu não quero que me conte como você estará
mascarada, quero surpresa. Vou te caçar a noite inteira, até te encontrar.
– Combinado. Aí
a gente se pega no banheiro como se você fosse minha mulherzinha – ela ri
também, saindo do box enrolada na toalha e se posicionando em frente ao espelho
em cima da pia.
– Veremos! –
Tatiana riu mais alto, enrolando a toalha no cabelo e saindo nua para o quarto.
O café já estava pronto quando
acabaram de se vestir. Patrícia estava agitada e já tinha servido a mesa quando
Tatiana e Mariana desceram até a cozinha. As três vestiam jeans e uma camiseta
de manga comprida, tudo preto, no peito o logo comemorativo dO Bistrô,
desenvolvido pela Rubi especialmente para a festa. Nas costas o emblema se
repetia, maior, junto da assinatura da agência. Assim como a chef, Mariana e
Tatiana também calçavam all star, embora Patrícia fosse trocar de roupa assim
que chegasse ao trabalho, incluindo o calçado.
– Vai ser muito
fácil te reconhecer assim – Patrícia brinca, apontando com os olhos para os pés
amarelos de Mariana, a única a não escolher um tênis preto.
– Amor, eu vou
estar trabalhando, assim como vocês – Mariana responde dentro da caneca de
café, que escondia seu sorriso – A gente vai se pegar na meia horinha reservada
unicamente para este fim. A máscara será diferente nessa hora, a roupa também.
A ideia é essa – ela riu – É uma festa, garotas.
– Eu quero só
ver – Patrícia finaliza.
Não voltaram mais a tocar no
assunto porque tão logo terminaram o café da manhã, já saíram rumo ao
restaurante. E ao passarem pela porta giratória da entrada dO Bistrô, o trisal
já se separou, com Patrícia a caminho da cozinha, já disparando ordens desde a
entrada, e Tatiana indo mais para os fundos, junto com Zezé, que chegou ao
mesmo tempo que elas.
Mariana em realidade não tinha uma função específica; não ajudava na
cozinha porque mal sabia fritar um ovo. Não contribuía na gerência porque
entendia pouco do assunto, mas principalmente porque sentia que Zezé não
gostava dela. Não podia nem tentar ser útil auxiliando os garçons porque geral
virava a cara quando ela passava, provavelmente porque Andreia tinha “feito sua
caveira”.
Então, para não ficar à toa, foi ajudar Pedro, ao ver o garçom
descarregando algumas caixas na entrada de serviço. Ele era gentil com Mariana,
mas porque era gentil com todo mundo.
O salão foi mudando de aspecto
conforme os móveis originais foram saindo, dando lugar a mesas e cadeiras
alugadas para a festa, arrumadas próximas às paredes, com a parte central livre
para circulação. O bar, nos fundos, se transformou numa espécie de pista de
dança, inclusive com o espaço reservado para DJ, no canto. Lola chegou cedo e
Mariana ficou uma parte do tempo com a amiga, até decidir sair para dar uma
volta, já que ali não estava contribuindo para muita coisa. Compraria as
máscaras na 25 e almoçaria na Liberdade.
Ao voltar no fim do dia, o restaurante
já estava completamente diferente. A decoração dava o tom da festa e Mariana
ouviu a música tocar lá fora, assim que parou o carro. Encontrou a gerente na
entrada dO Bistrô e Zezé já estava com a máscara que os funcionários usariam
durante o evento, um modelo preto que tampava a parte dos olhos, adornado com
pedras e penas brilhantes e coloridas. Embora a roupa fosse a mesma que a sua,
e de todos que circulavam por ali, a mulher ainda assim era perfeitamente
reconhecível, o que deixou Mariana satisfeita, por ter escolhido máscaras que
tampavam bem o rosto.
Estava levando a sério a ideia de se encontrar com Patrícia e Tatiana
como se fossem um caso de uma noite só, e quanto mais escondidas elas
estivessem em suas pequenas produções, melhor.
– Será que a
rede suporta esse tanto de coisa puxando energia ao mesmo tempo? – ela pergunta
para a gerente, logo que entra no salão.
– Não sei,
Mariana – Zezé responde, parecendo sem muita paciência.
– Talvez seja
válido arranjar um gerador, só por precaução, né – Mariana complementa, desta
vez olhando para a esposa, que ajeitava alguma coisa em cima de uma das mesas,
perto dali.
– Não vejo
necessidade, Mari – Tatiana fala, sem olhar para ela. Contou por algum motivo
as cadeiras em volta da mesa – Nunca tivemos nenhum problema antes.
– Nunca tivemos
nenhuma festa antes! – Mariana retruca, caminhando em direção ao bar – Com DJ,
com mesa de som, com esse monte de luz... – ela foi listando, determinada a
falar com Patrícia, que era mais sensata.
– O que que está
falando sozinha, doida? – Lola ri, lavando uma sequência de copos quadrados.
Pela primeira vez usava uma camisa escondendo seus braços e Mariana se
perguntou o que Tatiana teria achado disso. E Patrícia! A bartender estava
vestida igual aos demais e o preto das roupas contrastava com seus dreads
coloridos.
– Não é
“sozinha”, é com a minha mulher – Mariana sorri, levantando os ombros, como se
dissesse o óbvio.
Ao entrar na cozinha, o local
parecia ferver, numa agitação atípica, muito mais em polvorosa do que nos dias
normais. Havia um chiado de vários alimentos fritando, guisando, refogando,
provocando aromas e vapores diversos que imediatamente embaçaram as lentes de
seus óculos. Os cozinheiros se movimentavam num rebuliço, mas sincronizados e
organizados, sob a batuta da chef. Patrícia, no fluxo, nem reparou na esposa
ali.
– Amor? –
Mariana a chamou, quando a mulher passou por perto.
– Oi, querida.
Está tudo bem? – Patrícia pergunta, olhando brevemente para o relógio acima da
porta. Já eram quase seis e meia.
– Vou sair para
arranjar um gerador, Pati. Estou preocupada de as coisas da festa pesarem muito
a rede e termos um apagão ou algo do tipo – ela responde, apoiando os óculos
sujos em cima de um armário, ao lado da porta. Teve que falar alto para a mulher
ouvi-la, devido ao furdunço que preenchia o local.
– Tá, mas não
vejo necessidade, gata. O que a Tati disse sobre isso? – Patrícia quer saber,
se afastando dois passos para o lado, quando um cozinheiro passou por elas
segurando uma panela fumegante. A chef limpou a mão no avental da cintura antes
de dar uma ordem para alguém, chamando a atenção para o horário avançado.
– Não falei com
ela ainda – Mariana mente, evitando encará-la nos olhos. Para não correr o
risco de ser pega na mentira, mandou um beijo no ar para Patrícia, saindo da
cozinha. Se porventura acontecesse uma sobrecarga, considerou que o mínimo era
estar precavida. Preferia pecar pelo excesso do que pela falta.
– Já vai dar
rolê de novo? – Lola brinca, acompanhando Mariana tirar a chave do carro do
bolso de trás da calça – Volta logo que a festa já vai começar.
– Eu volto
rápido – Mariana segue o olhar da bartender até a DJ, que ouvia sozinha às
músicas remixadas, pelo fone de ouvido gigante.
A meta nem era voltar logo.
Mariana se sentia entediada de ficar no restaurante sem ter muito o que fazer,
e com as duas esposas ocupadas, sem poder dar atenção a ela. Se possível,
retornaria só bem mais tarde, quando a festa já estivesse bombando, mas tinha
pressa em resolver o assunto do gerador. Por isso, ainda que fosse sábado e já
quase de noite, Mariana dirigiu até um lugar que sabia que a atenderia, no meio
da Santa Efigênia. Tinha uma antiga fornecedora lá chamada Tuca, que ela
contactou durante o trajeto, numa ligação por viva-voz. Disse o que precisava,
falou que estava com um pouco de pressa e pediu para que ela deixasse um
gerador já separado, nas especificações que repassou. Ao chegar lá, Mariana nem
precisaria ter descido do carro porque o objeto foi colocado dentro do
porta-malas por um moça magra, que a cumprimentou pelo nome, mas ela não a
reconheceu porque estava sem os óculos. Foi só então que percebeu que estava
sem.
Mariana então se sentiu na obrigação de desembarcar, porque Tuca a
convidou para um cafezinho, que elas tomaram ali na rua mesmo, encostadas no
carro. Era o mínimo aceitar, considerando que a mulher a atendeu quando todas
as lojas já estavam fechadas há bastante tempo.
No caminho de volta até o
restaurante, tomou o cuidado para dirigir sem colocá-la em nenhum tipo de
risco, como fazia sempre que se via rendida pela própria miopia e distração. E
de fato prestou bastante atenção às ruas, aos motoristas e ao trajeto em si. Só
relaxou um pouco ao se aproximar de um semáforo fechado, enquanto diminuía a
velocidade, quando se distraiu vendo uma notificação do celular, preso no
painel ao lado do volante. Era uma mensagem de Tuca, querendo apenas confirmar
se a voltagem do restaurante era mesmo 110v. Era, mas antes fosse 220v porque a
preocupação lhe custou a dianteira do carro, que Mariana enfiou na traseira do
veículo que estava parado no sinal vermelho.
– Puta que
pariu! – Mariana xinga, ao sentir o impacto da batida, o barulho alto do choque
entre os metais. Viu o motorista do carro movimentar o braço, como esbravejando,
então ela fez um sinal para encostarem perto da guia – Porra, que merda,
caralho...
Mariana desce do carro para
avaliar o estrago. Por sorte, o arranhão tinha sido maior que o amassado, mas o
mesmo não podia ser dito do outro veículo, bastante avariado. O para-choque
tinha afundado para dentro do porta-malas.
– Oi, nossa, me
desculpa, eu me distraí um segundo... Você está bem? Se machucou? –
Mariana pergunta, ao ver uma mulher desembarcar. A motorista não falou nada num
primeiro momento, só levou as mãos à cabeça depois de ver a gravidade da batida
– Eu vou acionar meu seguro, vou chamar a polícia – ela continuou, embolando as
frases. Suas mãos tremiam, incapacitadas de digitar qualquer número.
– Não me
machuquei. Eu estava indo trabalhar – a mulher diz. Só então olhou para ela,
com uma expressão que parecia fúria, mas ao mesmo tempo um pouco de
desorientação.
– Me desculpa,
moça. De verdade...
– Tudo bem. Não
foi grave, estamos bem. Nada é por acaso, afinal – ela retruca, cabisbaixa –
Vai saber qual foi o meu livramento com isso...
– É, eu tenho
uma conhecida que fala assim... Que tudo tem um motivo, até os desvios. Qual o
seu nome? Eu me chamo Mariana – ela leva o celular até a orelha, informando a
placa de seu carro para alguém do outro lado da linha.
– Mayara – a
motorista diz, puxando do bolso o celular que começou a tocar. Se encostou no
carro para atender – Oi! Tudo bem e você? Nada, menina... acabaram de bater no
meu carro. Aham, bateram em mim. Não, não me machuquei, só a Mafalda que se
arrebentou. É, eu estava parada, ela veio e bateu atrás. Uhum. Sim, foi o que
eu acabei de dizer. Ah, sério? Claro! Não, nem vou trabalhar mais, não tem
condições de rodar desse jeito. Sim, amassou tudo. Pois é... Tá bom, saindo
daqui eu já te ligo e a gente se vê. Eu também. Outro, tchau.
– Olha, vou te
dar meu cartão. Sei que o recomendado é não fazer isso, mas me sinto à vontade
por você ser mulher. Já estou fazendo o BO.
– Perfeito, vou
te dar o meu também – Mayara lhe entrega um cartão preto, perfumado. Seu rosto
se iluminou brevemente com as luzes do giroflex de um carro da polícia, que
encostou logo à frente.
– Ah, que droga,
você trabalha como Uber... Eu estraguei mesmo sua noite, me perdoe... – ela
esfrega os olhos, visivelmente chateada.
– Relaxa,
Mariana. O importante é que ninguém se machucou. Vou tirar a noite de folga,
aproveitar para curtir a gata. Em casa, não em hospital, está tudo certo.
– Faz bem.
Nossa, eu vou ouvir um monte lá na minha casa, por ter dirigido sem
óculos... Mas vai ser merecido.
– Vai, sim –
Mayara ri, apesar do que dizia.
As duas conversaram rapidamente
com o policial, sendo instruídas a deixarem o local, pois permanecer ali era
passível de multa, por se tratar de via pública. O guarda foi embora após
verificar que o acidente não envolvia nenhuma vítima.
– Sei que não
vou conseguir jamais te compensar, mas está rolando uma festa no restaurante da
minha esposa. Vou colocar o seu nome na lista, por favor, vá. Leva sua gata –
Mariana diz antes de ir embora, lhe entregando agora o cartão dO Bistrô – É uma
festa privada, mas todos estarão de máscara.
– Ah, que bacana
– a motorista guarda os dois cartões no bolso da jaqueta – Sua seguradora entra
em contato? Posso te ligar amanhã?
– Sim, claro,
com certeza. Me desculpe novamente, Mayara – Mariana se despede com um aceno
breve.
– Dirija com
cuidado, moça – a motorista se despede também.
Mariana dirigiu o restante do
caminho ainda mais devagar, já que o capô do carro estava um pouco levantado
perto da tampa e um dos faróis tinha queimado. Deixou o gerador dentro da mala
porque ao parar em frente aO Bistrô viu que muitos convidados já tinham chegado
e ela nem teria também onde enfiar algo que tanto Tatiana quanto Patrícia
haviam rejeitado.
Deixou as máscaras das esposas
lá em cima, no sofá do escritório, mantendo a sua um pouco mais escondida, na
cadeira atrás da mesa. Junto deixou o vestido que tinha separado para usar
quando chegasse o momento do encontro com as duas, e antes de descer para o
salão colocou a máscara que fazia parte do uniforme da noite.
Lá embaixo já havia farta
agitação, com as mesas quase todas ocupadas por convidados sorridentes, que
bebericavam drinques coloridos acompanhados por canapés servidos em barquinhas.
Mariana sentou-se perto do balcão do bar, cumprimentando Lola com um aceno.
Dali reparou que a amiga usava um all star idêntico ao seu.
– Boa noite,
senhorita. Perdeu seus óculos? – a bartender lhe entrega uma bebida, sem que
ela pedisse.
– Ai, nem queira
saber... Não só perdi, como perdi e ainda bati o carro na volta – ela bebe um
gole bem servido, afogando parte de suas frustrações. A máscara ficou
esbarrando no copo e por isso ela a tirou antes de tomar mais um pouco, a
apoiando em cima do balcão.
– Sério? Que
bosta, hein...
– É, pois é –
Mariana gira em cima da banqueta, contemplando o movimento. Os convidados da
festa se destacavam dos clientes habituais apenas devido às máscaras que
tampavam parcialmente o rosto, porque de resto, o borrão era igual.
– Eu vou beijar
uma boca até o fim da noite – Lola afirma, sem especificar quem, mas olhava na
direção de onde estava a DJ – É um baile de máscaras, afinal, ninguém é de
ninguém...
– É, não sei se
é bem assim, viu – Mariana ri, bebendo mais um gole generoso de sua bebida
alcóolica borbulhante – Mas eu vou aproveitar essa festa e beijar duas bocas
até o fim da noite. Combinei com as meninas de a gente se pegar mais tarde no
banheiro – ela revela, em um tom mais baixo – Usaremos máscaras diferentes para
isso.
– Você e suas
esposas? – Lola pergunta, com cara de deboche.
– É, mas
estaremos mascaradas... Hoje “ninguém é de ninguém” entre nós. Daqui a pouco eu
vou inclusive subir para me trocar – Mariana repara quando Lola trava a postura
– O que foi?
Por instinto, olhou à volta, à
procura de algum perigo. O bar estava lotado, com muitos mascarados ostentados
seus paetês em conversas animadas entremeadas de risadas. Não encontrou nada
que pudesse representar risco, mas sem óculos ela mal se via no espelho.
– Amiga, acho
que o Carl está aqui – Lola estava pálida quando tirou a máscara, mas logo pôs
de volta, considerando que a disfarçava mais.
– Quem? O
carinha da gringa de quem você fugiu? – Mariana ri.
– Mulher, é
sério. Eu preciso me esconder, Mariana – ela parecia aflita – Vai, arranja algo
para eu tampar meu cabelo – Lola puxa as mangas do uniforme, grata por estar
com suas tatuagens tampadas.
– Lolita, como
que você vai se esconder no meio do evento? Além disso, está todo mundo de
máscara, como você o reconheceria assim?
– Mari, por
favor...
– Tá bom –
Mariana se levanta. O princípio de choro na voz de Lola a convenceu de que se
tratava de algo sério – Vou te arranjar um chapéu, sei lá. Uma cartola!
Mariana atravessou o mar de
gente, os olhos contraídos atrás da máscara preta, tentando não esbarrar em
ninguém. Passou pela cozinha e pegou duas cartolas que tinha visto mais cedo,
na mesa de Zezé. Colocou uma na cabeça e levou a outra para a amiga. Na volta,
passou quase irreconhecível por Patrícia, que pareceu não vê-la.
– Aqui – ela
entrega o chapéu para a bartender, meio abaixada atrás do balcão – Ainda acho
que é brisa sua, amiga, mas em todo caso...
– Não é brisa...
– Lola rebate, fazendo um biquinho. Enfiou os dreads dentro da cartola,
ajeitando a máscara mais abaixo na sequência. Estava agora exatamente igual à
Mariana, que fez um sinal de positivo para ela, ao vê-la montada – Mas mesmo
que seja, valeu pelo corre – ela aponta para a própria cabeça e lhe entrega
outro copo de bebida.
– De nada,
bonita – Mariana responde, tirando sua indumentária mais uma vez para poder
beber. Manteve o chapéu porque era estiloso.
– Oi! Mari?! –
alguém a cumprimenta, parando ao seu lado.
– Oi? – Mariana
tenta reconhecer a mulher antes que ela tirasse a máscara, se recordando
imediatamente ao ver a combinação daquele sorriso insistente com aquele cabelo
cacheado – Ritinha! Olá! Nossa, há quanto tempo! – elas se abraçam por um
momento.
– Então, há
quanto tempo mesmo! Tudo bem? Você trabalha aqui? – ela senta ao seu lado,
fazendo um gesto para a bartender atrás do balcão, pedindo um drinque igual ao
de Mariana.
– Não. Sim, quer
dizer, mais ou menos – ela toma um golinho da bebida – Estou aqui mais como
membro de apoio, por assim dizer.
– Ah, que ótimo.
Me ajuda por favor a encontrar a minha chefe, então, já que você conhece o
lugar – Rita a puxa pela mão, as levantando.
– Você trabalha
na agência ou é cliente da Rubi? – Mariana vai andando um pouco mais à frente,
abrindo caminho por entre os convidados, à procura de alguém que ela nem sabia
quem era. A música alta a forçava a se virar em direção à Rita para ser ouvida
e somente ao fazer a pergunta é que constatou que tinha esquecido sua máscara
lá atrás, no bar. Se lembrou então de Patrícia dizendo mais cedo que seria
fácil reconhecê-la num baile de máscaras... Ela nem imaginava o quanto!
– Trabalho na
agência, tem uns anos. Fui contratada um pouco depois de quando nos conhecemos
– Rita responde, perto de seu ouvido. Teve que ficar na ponta dos pés para
isso, e apoiou a mão em seu ombro.
– Ah, sim. É
verdade, me lembro mesmo que você estava terminando a faculdade de Publicidade
naquela época. Que legal!
– Sim. E você, está namorando? Nunca mais te
vi, Mari! Nem aquela sua amiga... como ela se chama mesmo?
– Perla. Pois é,
a gente casou.
– Mentira! – a
voz de Rita saiu um pouco esganiçada.
– Não, digo. Nos
casamos com pessoas diferentes – Mariana ri – A Pê conheceu uma doida e foi
embora para o interior. Mora num sítio já tem um tempinho.
– Ah, sim. E
você se casou por aqui, entendi. Mas quem diria, hein! – Rita parecia surpresa,
quando pararam de andar e se olharam por um instante – Você, casada. Nunca
imaginei.
– Pois é, eu...
– Mariana –
alguém a chama, perto da porta giratória.
– Ah, que bom
que você veio! – Mariana cumprimenta Mayara com um beijinho, e a moça que
estava junto com ela, de mão dada. Reconheceu a motorista graças aos seus olhos
cinza, escondidos atrás da máscara vermelha – Tudo bem? Que bom que vieram,
sejam bem-vindas.
– Essa é a Taís,
minha namorada – Mayara apresenta, só então vendo a mulher que acompanhava
Mariana, logo atrás dela. O local estava apinhado e muitos usavam máscara, mas
imediatamente a reconheceu – Oi, Rita.
– Oi, namorada.
Oi, quer dizer... Oi, Mayara – Rita pigarreia, cutucando a costela de Mariana –
Mari, eu vou indo, preciso mesmo encontrar a minha chefe.
– Sim, eu vou lá
com você – Mariana responde, sem perceber o mal-estar instaurado entre as
mulheres – Meninas, por favor fiquem à vontade, aproveitem bem a festa!
Mariana seguiu Rita pelo salão,
tomando a dianteira ao ver que andavam em círculos. Foi cumprimentando pelo
caminho algumas pessoas que acenavam para ela, sem reconhecer ninguém.
– O que passa?,
sua chefe sumiu como? – Mariana pergunta, depois de não a encontrarem nem no
fumódromo, o último lugar a procurarem.
– Sumiu
porque... aconteceu um babado forte – Rita responde, suspirando, sentando-se
numa banqueta reservada para fumantes. Puxou dois copos da bandeja de um garçom
que passou por ali, entregando um para ela.
– Sério? Me
conta, adoro babados – Mariana encosta o copo no dela, brindando.
– Mas não
espalha, tá? – ela pede, olhando à volta como se alguém fosse se interessar por
seu relato. Continuou mais baixo – Minha chefe foi intimada pela esposa da
amante.
– Uau! – Mariana
bebe um gole do drinque – É forte mesmo! E aí?
– Não, mas isso
nem é nada demais! Pelo que eu entendi, menina, a esposa sabia dela. Mas ela
não sabia que a esposa sabia, entendeu?
– Ahn – Mariana
faz uma careta, bebendo mais um pouco, tentando entender – A esposa sabia da
amante, mas a amante não sabia que a esposa sabia que ela era amante? Mas ela
sabia que a outra é casada?
– Isso sim.
– E foi intimada
aqui na festa? Por quê?
– Foi. Então, aí
que está. Porque a esposa descobriu que antes da amante, ela já tinha sido
traída com a assistente. Debaixo do nariz dela!
– Eita, que dó.
– Dó da minha
chefe, né? Que se enfiou nessa trama de malucas – Rita continua, em tom de
segredo, falando baixinho.
– Mas não entendi.
O que sua chefe tem a ver com o caso que a amante tinha com a assistente? Se é
algo anterior a ela...
– Ela não tem
nada a ver – Rita dá um sorriso breve, que logo trata de conter – No caso,
minha chefe só se fodeu. Imagina só, ela estava esperando a amante vir à festa
hoje. Só que a esposa veio no lugar, usando a fantasia que a amante usaria,
olha que maquiavélica! Ardilosa! Se vestiu como a outra estaria vestida só para
vir aqui dizer que elas são cornas juntas.
– Nossa, que
rolo... – Mariana apoia o cotovelo na mesa e o rosto na mão, a mente um pouco
entorpecida pelo álcool e pelo causo que ouvia – E onde será que está sua chefe
agora?
– Não sei, eu
bem que queria saber também – Rita responde, puxando um fiapo colorido da aba
do chapéu dela.
– Qual que é
mesmo o nome da sua chefe? – Mariana pergunta, com a voz um pouco embargada.
– Miriá – Rita
responde, quase cochichando. Colocou a mão em concha sobre a boca, para não
correr nenhum risco de fazerem leitura labial e descobrirem seus segredos.
– Mentira! –
Mariana rebate, aproximando de repente seu rosto do dela. Quando continuou,
falou tão baixo que Rita é quem precisou ler em seus lábios o que ela dizia –
Miriá, a amante da Célia?
– Mari? –
Tatiana a chama, ao vê-la sentada toda encolhida em uma das mesas no canto do
fumódromo. Olhou rapidamente para a mulher junto dela, sem reconhecê-la e seu
olhar era de poucos amigos.
– Oi, Tati –
Mariana ergue o braço, a cumprimentando, toda alegre – Amor, essa é a Ritinha,
Ritinha, essa é a Tatiana, minha esposa. Baby, você não imagina a história que
eu acabei de ouvir!
– Mariana! –
Rita a repreende, se escondendo atrás da própria mão.
– Amada, eu não
tenho como esconder as coisas da minha mulher! – Mariana se defende, rindo – E
a Tati ama um bafão.
– Isso aqui é
seu? – Tatiana mostra os óculos de Mariana.
– Ah! Que linda,
você disse que ia me caçar a noite toda e veio até aqui para me trazer a visão
de volta? – Mariana coloca os óculos e dá um beijinho nela.
– É, encontrei
lá dentro da cozinha, imaginei que estivesse fazendo falta. É verdade que você
bateu o carro? – ela pergunta, mais baixo, perto do ouvido da esposa,
aproveitando a privacidade proporcionada pelo abraço.
– Nossa, mas que
Lola fofoqueira! Boca aberta, gente, eu hein! – Mariana se levanta, demorando
alguns segundos para se firmar em pé. Reconheceu internamente que já estava
começando a ficar um pouco alta e ajeitou a cartola antes de continuar –
Ritinha, eu já volto.
– Tranquilo,
Mari. Talvez eu ainda esteja por aqui – Rita responde, se servindo de mais um
drinque. Estava exausta de procurar por Miriá.
– O que
aconteceu? Bateu onde? Por que você saiu de novo? – Tatiana pergunta, apertando
a mão de Mariana a cada novo questionamento, conforme caminhavam por entre as
pessoas.
– Eu tive que
sair para buscar um gerador.
– Amor, mas eu
disse que não era preciso! Como você é teimosa, Mariana! – ela reclama, subindo
a escada até o escritório atrás da esposa.
– Tati, se algo
acontecesse e eu não estivesse prevenida, jamais ia me perdoar – Mariana retruca,
sobre o ombro.
– Tá, mas você
concorda que se não acontecer nada, você vai ter saído à toa, e batido o carro
mais à toa ainda? – Tatiana resmunga, vendo a mulher tirar a blusa, trôpega,
perto da mesa de Patrícia – Imagina se o acidente é grave, Mari, se você se
machuca. Tudo por causa de um apagão imaginário! Por causa da sua teimosia!
Como uma ironia do destino, ao
terminar seu comentário, Tatiana viu tudo ficar repentinamente quieto e escuro,
o silêncio dando lugar aos gritos animados dos convidados, que pareceram
acreditar inicialmente que o apagão era algum efeito especial da festa.
– Isso aí é
praga sua! – Tatiana reclama, acendendo a lanterna do celular para clarear o
escritório e ajudar Mariana a se vestir.
– Ah, então
agora a culpa é minha? Eu só me antecipei ao óbvio, Tati, dizendo que ia
acontecer exatamente isso que está acontecendo – Mariana responde, zangada,
sentindo o zíper do vestido preto sendo fechado nas costas pela mulher – Mas
ainda bem que sou precavida e tenho um gerador na mala do meu carro amassado,
não é mesmo?
As duas desceram a escada de
mãos dadas, a lanterna do celular de Tatiana iluminando parcamente os degraus.
No salão, os convidados se valiam do mesmo artifício, criando um clima
intimista no ambiente, que combinava com as máscaras e a decoração da festa.
Ninguém parecia estar incomodado com a falta de luz.
Ao chegarem lá embaixo, perto da porta giratória, ao invés de saírem para
pegar o gerador dentro do carro, Mariana tomou a frente e foi na direção
contrária. Determinada, saiu abrindo caminho entre os convidados praticamente
com o ombro, a fúria contrastando com seu vestido decotado de mulher fatal.
– Amor? –
Tatiana a chama, tentando puxar sua mão para irem no sentido oposto, para onde
deveriam ir.
– Eu vou acabar
com aquela fura-olho! – Mariana rosna, apontando com a cabeça em direção à
cozinha, para onde via a cartola de Lola.
Foi só então que Tatiana viu.
Estava tudo escuro, mas ela era capaz de reconhecer Patrícia em qualquer breu
que fosse. Mesmo que a esposa estivesse envolta nos braços de uma estranha, ou
dentro um beijo empolgado, como era o caso agora.
Ela só não andou mais rápido
para chegar antes nos fundos dO Bistrô porque o restaurante estava
terrivelmente cheio e porque Mariana abria bem o caminho por onde passavam,
praticamente acotovelando as pessoas, que curtiam a festa alheias à raiva que
naquele momento movimentava as duas. Era a primeira vez que Tatiana via a
esposa assim, tão zangada.
– Patrícia? –
Tatiana a chama, cruzando os braços ao mesmo tempo que Mariana, parecendo
sincronizadas. Viu que seu chamado causou um sobressalto nas mulheres – O que
você está fazendo? – sua voz saiu num tom sério, quase frio. Num fio.
– E aí, Lola? O
que está pegando? – Mariana intima, ao mesmo tempo, jogando a luz do celular no
rosto das duas. Ao contrário da esposa, ela praticamente gritou, mexendo com os
braços, como se fosse bater na bartender. Mas só pegou a bombinha de asma que
Tatiana entregou.
– Nossa! –
Patrícia pareceu a princípio sinceramente surpresa, vendo elas paradas ali. Se
afastou imediatamente de Lola, como se só então a reconhecesse, sob a luz da
lanterna – Amor, é que eu te vi mais cedo passando lá perto da cozinha de
chapéu, e aí... O tênis... – ela começa a se explicar, apontando para a cartola
e os pés de Lola, mas logo se cala.
– Eita, Mari,
foi mal, amiga, não me liguei, eu... – Lola se justifica, gaguejando – Estava
tudo escuro, não vi direito...
Tatiana e Mariana se encaram por
um instante, sem dizer nada, embora muito estivesse sendo dito. Não era de hoje
que Tatiana era enciumada com a bartender e a troca de olhares foi
significativa, pois Mariana finalmente se tornava sua aliada para essa questão.
Em silêncio, novamente se deram as mãos e começaram a definir, juntas, o
que fariam com relação ao ocorrido. E quanto a isso, só o tempo seria capaz de
dizer.
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