De A a Zezé (conto)

Esta é a primeira história da segunda temporada da Novelinha. Divirta-se!

 Se não leu o final da primeira temporada, clique aqui.


Ainda era cedo naquele sábado, os relógios da ciclovia da Avenida Paulista não marcavam 8h da manhã de um dia azul. Zezé pedalava na faixa entre os carros que circulavam àquela hora pelo local, e a movimentação a fazia pensar na sorte por poder se locomover de bicicleta pela cidade. Não que morasse exatamente próximo ao trabalho, mas seu trajeto incluía longos percursos seguros para andar de bike e, desde a sua contratação nO Bistrô, oito anos atrás, era assim que saía e voltava para casa, seis dias por semana. Exceto quando chovia, que daí ela precisava chamar um Uber.

Pedalou sem muita pressa quase até o fim da via, nos ouvidos seus fones reproduzindo os últimos minutos de um podcast sobre Síndrome do Espectro Autista. Cada semana Zezé encasquetava com um assunto e saúde mental era sua bola da vez. As músicas ela deixava para ouvir no trabalho, embora fosse comum o som passar despercebido, mesmo tocando o dia inteiro.

Tirou o capacete assim que chegou à calçada do trabalho. As vagas ainda estavam vazias e a rua se encontrava erma, como era de costume aos fins de semana. Seu serviço, porém, era mais intenso neste dia, tanto para almoço quanto jantar, e por isso Zezé sempre fazia hora extra, que nem tinha mais esse nome.

Entrou pela lateral do restaurante, depois de destrancar o portãozinho que dava acesso à área de entrega de encomendas, que quase se emendava à sua sala, localizada uma porta atrás. Dali tinha acesso direto à cozinha, por onde transitava, o que a obrigava a se manter sempre com a proteção no cabelo, obrigatória naquela área.

Mas nesta manhã Zezé guardou a touca no bolso da calça e antes de atravessar o bar e o salão principal para destrancar a porta giratória lá na entrada, viu atrás do vidro a silhueta de dois funcionários, que já a aguardavam na calçada.

Por sorte, um deles era da cozinha e certamente providenciaria o cafezinho antes de Patrícia chegar. Agora era hábito ela se atrasar.

– Bom dia, bom dia – Pedro cumprimenta, depois de um beijinho na lateral de seu rosto. O garçom tinha um costumeiro bom humor matinal – Zezé, você está sabendo dessa história da Andreia?

– Porra, Pedro, eu acabei de te contar! – Filipo reclama, desfazendo a cara feia apenas para cumprimentar a gerente – Bom dia, Zezé! Já vou já preparar um cafezinho que eu sei que você está esperando isso!

– Sim, por favor! – Zezé dá dois tapinhas no ombro do cozinheiro, depois de um beijinho em seu rosto – A chef disse que desta vez não se atrasa.

– Aham – Filipo dá uma risadinha, trocando o boné preto por uma touca de proteção branca, caminhando para os fundos dO Bistrô.

– Que história com a And...? – Zezé pergunta, mas se cala ao ver a garçonete passar pela porta.

– Bom dia, Zezé – Andreia cumprimenta, dando um abraço breve após cumprimentá-la com um beijo no rosto – Tudo bem? Tem café? Qual o assunto dessa reunião de hoje, hein?

– Bom... – Zezé começa a responder, mas é interrompida por Pedro.

– Vai rolar uma festa, semana que vem – o garçom diz, fazendo um movimento que imitava uma dancinha – Galera de agência, descolada, tal e pá.

– Como você sabe disso? – Zezé pergunta, mais uma vez impressionada com o fato de o colega saber de tudo o que ocorria nO Bistrô. Desconfiava que ele sabia até de mais coisa que ela própria, que se considerava bem informada sobre todos os assuntos.   

– E esse anúncio não podia ser feito mais tarde, no intervalo da tarde? Ou, sei lá, outro dia?, na segunda? – Andreia estava amarga, como era usual. Todos conheciam seu temperamento azedo, que vinha piorando nos últimos meses – A Patrícia inventa cada hora uma história... Não basta a gente ter que trabalhar mais aos sábados; tem que começar mais cedo também.

– Ah, mas eu aposto que isso é coisa da Tatiana – Pedro arrisca. Parou de sorrir ao ver Zezé o encarando – O quê? É verdade! Ela que adora essas coisas, não a chef.

– O intervalo da tarde não pode mais ser usado para assuntos internos – Zezé lembra, levantando a palma de uma das mãos, quando o carro de Patrícia estacionou na entrada do restaurante – Não foi o que nós combinamos no ano passado? Que intervalo é intervalo? – ela olha primeiro para um, depois para o outro, sem ter resposta de nenhum dos dois – E aos sábados nós trabalhamos mais, mas ganhamos mais também. Ou essa parte você se esqueceu, Andreia?

                A garçonete levanta os olhos e suspira de maneira ruidosa, se virando em direção ao banheiro, onde ficou até o início da reunião. Zezé ficou atenta, para o caso de ter que ir atrás dela antes de Patrícia começar a dizer o que tinha para falar.

– Bom dia, querida – Patrícia cumprimenta, a abraçando – Grata por ter vindo mais cedo, acho importante alinharmos todos os detalhes para o evento da semana que vem.

– Bom dia, é claro – Zezé sorri para Tatiana, que veio logo atrás e a abraçou por um tempo um pouco maior – Oi, Tati!

– Bom dia, Zezé, querida – Tatiana sorriu para ela e ao se afastar um passo para o lado, não viu a feição da mulher se alterar brevemente, antes de cumprimentar Mariana.

– Oi, Zezé – Mariana lhe dá um beijinho, com o rosto de lado. Ao contrário das esposas, sempre reparava que Zezé era diferente com ela – Bom dia, tudo bem?

– Tudo bom – Zezé responde, e se esforça para sorrir ao final – Vou ver se o pessoal precisa de ajuda com o café – ela diz, se afastando do trisal.

– Essa mulher não vai com a minha cara... – Mariana resmunga.

– Mari, não começa... – Tatiana tinha o semblante ameno, e alisou sua mão por um breve instante – Isso é coisa da sua cabeça, amor.

– Uhum – Mariana diz, a boca retorcida em um dos cantos, antes de se sentar. Puxou uma cadeira qualquer e tirou o celular do bolso. Ficou quieta porque sabia que aquele não era o melhor momento e nem o melhor local para falarem a respeito do óbvio.

– Pessoal, muito bom dia – Patrícia diz, sua voz se impondo nos quatro cantos do salão.

Imediatamente o burburinho cessou e as vozes foram substituídas pelo breve arrastar de cadeiras, com a equipe se acomodando perto da chef. Quem estava mais distante, se aproximou, inclusive Andreia.

– Agradeço que estejam aqui, sei o quanto é difícil acordar mais cedo, principalmente aos sábados e com esse friozinho – ela continua, colocando uma das mãos no ombro de Mariana. Ficou parada atrás da esposa, o braço apoiado em cima do encosto da cadeira – Mas quero compartilhar com vocês que na próxima semana, no sábado, nós vamos sediar um evento aqui nO Bistrô da agência de publicidade Rubi, que está comemorando aniversário e escolheu o nosso restaurante para sediar a festa.

                O anúncio imediatamente gerou comentários, funcionários questionando sobre o menu, outros perguntando a respeito do espaço, da decoração. Zezé reparou que Mariana era a única que se mantinha quieta e a única que sorria. Parecia se divertir por estar ali, no meio de pessoas que não eram suas colegas de trabalho. Antes de Patrícia voltar a falar, Mariana deu uma levantada sutil com o ombro, aproximando o rosto das costas da mão da chef, que sorriu atrás dela.

                Zezé procurou por Tatiana no salão, que estava bem ao lado de Mariana, alheia ao afeto entre as duas. Aquela era uma cena que ainda lhe causava estranheza, mas aí logo Zezé se lembrava de que as três tinham um acordo que dizia respeito a elas e somente a elas.

– Sim, teremos um menu especial – Patrícia começa a responder, fazendo todos se aquietarem novamente. Ela foi apontando para quem tinha perguntado, demonstrando que era atenta aos detalhes, mesmo durante os pequenos caos que se instalavam de repente nO Bistrô – Sim, vai ser no bar, a Zezé vai cuidar disso e envolver quem precisar – ela dá uma piscadinha para a gerente – Vamos chamar freelancers, Pedro. Pode sim, chamar aquele seu amigo de novo. Andreia, a mesma coisa. Mas eu quero você trabalhando na festa, tudo bem? A gente chama alguém para te cobrir no salão.

– Combinado, chef – a garçonete responde, acenando na sequência para Zezé.

                A chef conduziu a reunião depois de tirar todas as dúvidas, apresentando um plano de ação que pela primeira vez foi projetado na parede do salão, do celular de Mariana. Zezé ficou pensando que aquilo era bem a cara da terceira integrante mesmo; quase tanto quanto o relógio sem números na parede oposta, que Mariana tinha inventado de pendurar. Mas reconheceu que a projeção era bastante lúdica e eficiente.

                Ao terminarem, quase uma hora depois, Patrícia chama Zezé, quando todos começaram a se dispersar. Aguardou que os garçons tirassem as xícaras de cima da mesa, arrumando as cadeiras de volta aos seus lugares, parando apenas para se despedir de Tatiana e Mariana, que foram embora juntas, no carro de Patrícia.

– Está tudo bem? Como você está? – ela pergunta, sentando com a gerente num dos cantos do salão.

– Estou bem, chef. Por quê? – Zezé levanta uma das sobrancelhas e a abaixa quando percebe o gesto.

– Nada... é só que, sei lá...

– O que houve, Pati?

– Você me diria se tivesse algo de errado? Já faz um tempo que te sinto estranha, mais distante, Zezé...

– Não estou – a mulher responde, levantando os olhos de maneira contraditória – Só tenho trabalhado muito, a Tati tem vindo com uma frequência menor, aí tenho mais coisa para fazer. Mas é só.

– Hum – Patrícia resmunga, com os olhos contraídos – O que você acha desse evento de semana que vem?

– A gente tira de letra, não tenho a menor dúvida. E vai ser um ótimo marketing para O Bistrô. Por falar nisso, esta seria a ocasião perfeita para você resolver aquela questão de rede social, de Instagram...

– Eu sei... – Patrícia suspira, coçando os olhos. Ela parecia cansada nesta manhã. Talvez mais do que aparentava nos últimos dias, que já era bastante – Vou pedir para a Mariana me ajudar com isso, ela tem contato de tudo que é gente. Prefiro me focar na cozinha, sem me distrair com essas coisas. Você me ajuda com todo o resto, né?

– Sempre, chef – Zezé segura sua mão por um momento e sorri, antes de se levantar. Pareceu querer se afastar, mas rapidamente mudou de ideia e se abaixou, antes de voltar a falar – O Pedro já sabia do evento. Como?

– Esse menino deve ter o ouvido nas paredes – Patrícia ri, se levantando também – Ele deve ter escutado no dia em que o pessoal da agência veio. Lembra?, aquele almoço semana passada, que a gente teve que preparar às pressas?

                Zezé sorri, se recordando do dia em questão. Nem tinha sido nada demais, mas a chef sofria às vezes por coisa pequena, que era o caso. Não percebeu que ao seu lado, Patrícia automaticamente mudou a expressão, ao se recordar de algo que não quis compartilhar.

– Bom, fica de olho – a chef diz, empurrando a cadeira para perto da mesa, sem especificar ao que se referia – A Tati disse que vem depois do almoço para vocês verem juntas as questões que ficaram pendentes. Ela vai te ajudar a administrar tudo isso, Zezé. Não quero você muito atarefada ou sobrecarregada.

– Tá bom, Pati. Fica tranquila, bom trabalho.

– Bom trabalho para a gente – Patrícia diz, mas dá meia-volta – Você sabe que é importante aqui, né? Eu te considero minha amiga e nas rotinas do restaurante você é fundamental para o funcionamento dO Bistrô.

– Grata, chef – Zezé desmontou um pouco a postura, surpresa com a fala de Patrícia – Conte comigo, sempre.

– Eu conto. E espero que conte comigo também, e me conte tudo o que te aflige – Patrícia responde, caminhando em direção à cozinha. Resmungou mais alguma coisa, que Zezé não escutou.

                A gerente bateu o olho no relógio do salão, antes de ir para sua sala. Reconhecia que a ideia de ver as horas ali não era de todo ruim e tudo indicava que também não representava um problema para os clientes, como supunha, que idealmente devem se manter no salão, consumindo, o máximo de tempo possível.

                No fundo, admitia que Mariana tinha boas ideias, renovou muita coisa nO Bistrô, desde que se casou com Patrícia e Tatiana. Desde antes, na verdade, porque a ideia do relógio veio quando o envolvimento entre as três mulheres ainda não era oficial – mas todos já comentavam sobre o assunto porque esse virou o tema principal da “rádio peão”, que levava e trazia diariamente as informações sobre os integrantes daquele lugar. E fofoca sobre chefe é sempre mais apimentada, Zezé sabia bem.

O problema é que sinceramente nutria uma birra contra Mariana, o que não a inspirava muito a querer interagir com ela. E estava ciente de que a mulher reparava nisso. Mariana se fazia de boba, com aquela carinha de avoada, mas era muito da esperta. Conhecia bem o tipo!

A gerente passou pela cozinha no momento em que Patrícia instruía os funcionários sobre o evento, compartilhando o menu para a noite de festa. Zezé ficou a manhã inteira focada nos afazeres da próxima semana e só saiu de sua sala próximo ao horário do almoço, para sua conferência do salão e bar, antes de o movimento se iniciar. Estranhou ao encontrar Tatiana por ali.

– Ué, achei que você vinha só depois – ela diz. Viu Mariana falando ao celular, perto da porta de entrada – Digo, a Pati comentou...

– É, eu vinha – Tatiana responde – Mas aí decidi vir antes, para te ajudar. Trouxe a Mari também, a gente pode abusar dela.

– Não precisa, Tatiana, que isso... Ajuda em quê?, a gente dá conta de tudo – Zezé parecia ofendida – Estamos com a equipe completa, não tem motivo.

– Eu sei, querida. Só quero te ajudar, ué – Tatiana a encara por alguns segundos, mais pensando no que dizer do que aguardando Zezé se pronunciar.

– A Patrícia falou com você, né? – Zezé pergunta e balança a cabeça antes de ouvir a resposta – Que bobagem, Tati. Eu só comentei que estava trabalhando muito...

– Sim, porque eu tenho vindo pouco – Tatiana rebate, interrompendo.

– É, mas tudo bem. Você tem o seu trabalho na escola, tem suas coisas.

– É, e o casamento anda me consumindo bastante também. Essa é a verdade – Tatiana se senta, parecendo disposta a conversar – Muita coisa para resolver, e aí teve a mudança de casa... As coisas foram meio que se atropelando. Mas estou me reorganizando, já.

– Sei – Zezé se senta também, na cadeira ao seu lado.

– Se houvesse algum problema você me diria? – Tatiana pergunta, a encarando daquele jeito que era difícil escapar de uma resposta sincera. Mais do que com Patrícia, era com Tatiana que Zezé sempre conversava. Sobre tudo, não só assuntos envolvendo o trabalho.

– Tipo o quê? Eu diria, Tati...

– Sei lá. Sabe... – Tatiana abaixa o tom de voz, apesar de estarem sozinhas no salão. Nem Mariana estava mais por ali – ...na semana passada aconteceu um incidente.

– Aqui? – Zezé instintivamente olhou para os dois lados, procurando algo de errado.

– É, mas nada a ver. Digo, não é nada preocupante, nem relacionado ao O Bistrô, relaxa. Eu estava no banheiro e acabei ouvindo demais. Ou ouvi o que não deveria ouvir, não sei.

– É a história da Andreia? – Zezé pergunta baixinho e reconhece a surpresa no rosto de Tatiana.

– Quê?, não! Qual história da Andreia? Não, pera, vou te contar primeiro a minha e depois você me conta a sua – Tatiana ri, mas logo fica séria de novo – Sabe aquela minha amiga Bruna?

– Sei, a que é casada com a Célia – Zezé responde, fazendo uma pausa antes do segundo nome, resgatado na memória.

– Essa.

– Que tem um caso com a publicitária lá da agência que vai fazer a festa semana que vem – Zezé continua – A que se chama Miriá.

– Isso! Sim!, isso que eu ouvi no banheiro! Você já sabia? – Tatiana pergunta, surpresa, com a mão em cima da boca. Após anos de convivência, ainda se surpreendia com a capacidade de Zezé sempre saber de tudo. Achava impressionante.

– Mulher, mas só se falou nisso depois que as duas se pegaram dentro do carro dela, lá no estacionamento, numa sexta-feira à noite! Na época ninguém nem queria atender a Célia, quando ela vinha aqui depois, porque diziam que ela tinha conhecimento de que tinha sido flagrada. Mas aí vimos que não. Ela só é desagradável.

– Gente! – Tatiana estava surpresa, com os olhos até um pouco arregalados – A Célia traiu a Bruna no estacionamento aqui do lado?

– Sim, mas faz tempo isso – Zezé afirma, sincera – Tem coisa de mais de ano, se não me engano.

                Tatiana bateu a ponta dos dedos no tampo da mesa, nitidamente envolvida com os pensamentos, porque embora quieta, fez algumas caretas nos instantes em que permaneceu introspectiva. Antes de voltar a falar, balançou a cabeça, como desaprovando algo que só ela ouvia.

– Você acha que, como amiga, eu deveria falar com a Bruna? – Tatiana pergunta, observando cada reação no rosto de Zezé.

– Falar que a esposa meteu um par de gaio na cabeça dela? Não sei, Tati. Essas coisas são complicadas, né...

– Você me falaria? Se soubesse que a Pati me traiu? Ou a Mari. Me falaria, Zezé?

– Ai, Tatiana... – Zezé resmunga, soltando o ar num suspiro pesado.

– Pergunta simples. Sim ou não?

– Não sei. Não. Provavelmente não.

– Poxa – Tatiana fez um biquinho, parecendo chateada.

– E você por acaso me falaria? Claro que não.

– Talvez – Tatiana não pareceu sincera.

– Aham. Você vai falar para a Bruna o que ouviu? Aham – Zezé emenda, se repetindo, diante do silêncio dela.

– Eu gostaria que você me falasse, se soubesse de algo. Isso ajuda? – Tatiana finalmente fala. Estava séria e sua voz saiu num tom mais grave, diferente do habitual.

– Ajuda – Zezé responde, a encarando por um breve instante – Tá, vou te falar uma coisa, então. Não é exatamente sobre traição, mas é algo que eu ouvi falar.

– Hum? – Tatiana faz um som, ansioso, erguendo a cabeça em sua direção. Pareceu que Zezé estava procurando as melhores palavras para aquilo porque demorou para voltar a falar algo.

– É sobre a Mariana – Zezé finalmente diz, mas logo fica quieta. Olhou sobre os ombros pelo salão, à procura da mulher – Que, ressalto, não sei se é verdade, mas...

– Ai, Zezé, fala logo, não me mata de angústia! – Tatiana pede, vendo lá na entrada os primeiros clientes chegando para o almoço – O que quer que seja, pode falar.

– Tá. É só que, pelo que eu soube, é comum a Mariana despedaçar corações por onde passa – Zezé revela, abaixando a voz ao pronunciar o nome da mulher – Ela simplesmente some, Tati. Desaparece, não volta nem para buscar as coisas.

– Ah – Tatiana responde, absorvendo uma informação que já detinha – E estão falando isso? Por quê?

– Porque ela fez isso não com duas, ou três. Fez com várias. Eu inclusive conheço uma – Zezé se levanta de repente, ao ver Patrícia a chamando perto da cozinha. Fez um gesto para a chef, mas não se moveu nem um centímetro.

– Entendi... – Tatiana responde, pensativa.

– Só me preocupo com vocês, Tati. Com você, com a Pati... Essa mulher chegou de repente, surgiu numa confusão durante o jantar – Zezé vira os olhos – E nenhum relato que chega sobre ela é positivo, só isso.

– Entendi – Tatiana repete e se levanta também – Eu entendi, Zezé. E agradeço por ter sido sincera comigo, por me falar isso. Com certeza vou refletir sobre o que fazer com relação a Célia e Bruna, que sem dúvida merece saber o que está acontecendo, às vistas de todos.  

– Boa sorte, Tati – Zezé diz, antes de caminhar em direção à Patrícia, nos fundos do salão. A chef tinha uma ruga marcando a testa.

– Zezé, por favor, reserva a mesa cinco para o Ricardo, que me mandou uma mensagem dizendo que vem almoçar – Patrícia vira os olhos e lhe entrega o celular, nitidamente aborrecida.

– Mas a cinco, chef? – Zezé pergunta, depois de ler a mensagem – Não prefere a 12, mais para o fundo do bar?

– Não, ele sentou lá da última vez. Quero essa gente hoje longe do relógio. Não me importo se eles decidirem ficar aqui até o jantar – Patrícia responde, se virando antes de Zezé poder se manifestar.

                A gerente consente com a cabeça e logo avisa aos garçons sobre a reserva da mesa em questão. Colocou uma plaquinha em cima, para não constranger nenhum cliente, e estava falando com Andreia quando viu entrar nO Bistrô uma mulher com o cabelo cor de rosa. Ela foi recepcionada com um sorriso e um abraço de Mariana.

                Zezé se manteve o tempo inteiro atenta às duas, que conversaram animadas enquanto permaneceram no salão, antes, durante e depois de almoçarem. Ficou satisfeita em ver quem as estava servindo e, após se despedirem, a gerente chamou o garçom.

– Quem é a moça que almoçou com a Mariana? – Zezé pergunta, mantendo a mulher à vista. Ela conversava com Tatiana e as duas subiram juntas para o escritório.

– Se chama Katrina – Pedro responde, sem titubear. Por algum motivo, imitou sotaque de italiano – É social media, parece que ela é quem vai cuidar das redes sociais dO Bistrô.

– Ah, sim – Zezé assente, também com a cabeça. Não disse mais nada porque precisou recepcionar o publicitário, que acabava de chegar.  

                Como Patrícia previa, Ricardo Gomes, o sucessor do todo-poderoso, dono da Agência Rubi, ficou no restaurante até quase o anoitecer, em companhia de pessoas tão barulhentas quanto ele. Isso a fez pensar que, então, Mariana podia até estar certa, mas ela também tinha razão com relação ao relógio na parede do salão.

                Zezé estava distraída com os públicos que agora se alteravam nO Bistrô, os clientes do almoço sendo substituídos por aqueles que entravam direto para o bar e que logo seriam sucedidos por quem chegaria também para o jantar. Tinha repassado mais cedo com Tatiana os detalhes para o evento do próximo sábado e por algumas horas pôde se dedicar exclusivamente à rotina normal do restaurante, que permaneceu cheio durante praticamente o dia todo. Estava no banheiro quando foi interpelada por Mariana, que pareceu aproveitar a ocasião para abordá-la.

– Oi, será que a gente pode conversar? – Mariana pergunta, assim que Zezé deixa a cabine. Estava encostada na pia, de costas para o espelho, com os braços cruzados. Ao contrário de mais cedo, agora tinha os cabelos presos num rabo de cavalo.

– Aqui? – Zezé pergunta, num tom impaciente. Não aguardou a resposta antes de continuar – Não tem um lugar melhor para isso?

– Tem, sim. Claro que tem – Mariana pisca rápido, um pouco surpresa com o retorno de Zezé. Suspirou ao descruzar os braços e pigarreou, sem graça – É que você está sempre ocupada, achei que agora poderia ser um bom momento, desculpe.

– É, eu ando sempre ocupada – Zezé pareceu se desarmar um pouco.

– Sim, e mais ainda depois que eu apareci – Mariana emenda e se apressa em continuar, ao receber um olhar curioso de Zezé – Porque a Tati tem vindo menos para cá e isso te sobrecarrega, sabemos.

                Zezé não disse nada, mas se esforçou para transparecer que estava minimamente disposta a dialogar com Mariana. Ao menos permaneceu ali, parada no meio do banheiro, em pleno horário de expediente, o que era um claro sinal de não recusa, ao que entendia. Não sabia exatamente sobre o que ela queria conversar, mas tinha lá as suas desconfianças.

– Tudo bem, sempre soube que havia esse risco. De a Tatiana ficar em casa à noite, eu digo – Zezé complementa, rapidamente.

– É, a Tati trabalha demais. A Patrícia também – Mariana comenta, mas como se apenas pensasse em voz alta. Voltou a focar em Zezé, ao encará-la depois de morder o canto do lábio inferior – Todos vocês. A Patrícia tem razão de atribuir o sucesso a vocês, o trabalho aqui é incrível. Eu me encantei pelo O Bistrô antes mesmo de conhecê-lo.

– Sei... – Zezé muda o peso de uma perna para a outra e cruza os braços, sem perder de vista os olhos da interlocutora. Embora por um lado parecesse interessada, por outro parecia contraditoriamente defensiva. Para não dizer em ataque.

– Então, o que eu queria falar com você... – Mariana pigarreou de novo, empurrando os óculos para perto dos olhos.

– Sim?

 – É que... Sei lá, queria saber se eu te fiz alguma coisa, por que você não gosta de mim.

                Zezé sentiu vontade de rir, mas porque achou honestamente engraçada a abordagem de Mariana. Imaginava que em algum momento ela poderia questionar algo nesse sentido, mas nunca imaginou que fizesse com aquela escolha de palavras. Porém, se manteve séria porque a pergunta era sincera e tinha fundamento.

                Zezé refletiu brevemente sobre o que dizer, considerando que Mariana não era uma pessoa qualquer. Ela era a esposa de suas chefes, de mulheres que admirava, que tinha como suas amigas, por toda a consideração que elas sempre tiveram com a sua pessoa. Mas era verdade também que tinha lá as suas ressalvas com Mariana e sentiu ser justo expor suas questões. Porque ela estava perguntando, apenas, pois se dependesse da vontade de Zezé em dizer algo, provável que morresse sem falar um A.

                Mariana era uma moça bonita, notavelmente mais nova que Patrícia e Tatiana, e Zezé conseguia compreender o que as havia atraído. Era algo que ia além da beleza, ou até mesmo da inteligência, que sabia ser algo que agradava às duas. Atribuía o encanto àquele ar distraído que Mariana carregava, tão diferente da aura séria de Patrícia e sua esposa original. Era algo tão marcante que Zezé tinha até a impressão de que Tatiana parecia mais leve, assim como Mariana, desde que tinha se enfiado num trisal. Tentava ao máximo não pensar nos assuntos pessoais de cada um, se esforçava para conter as fofocas entre os funcionários, mas todos diziam que agora Patrícia parecia mais cansada do que antes, ao contrário de Tatiana, que aparentava até ter rejuvenescido alguns anos.

                Voltou a encarar os olhos de Mariana, emoldurados em sardas que só agora reparou existir. Ela permanecia impassível, aguardando.

– Eu me preocupo com a Patrícia e a Tatiana – Zezé diz.

– Justo – Mariana rebate, quase imediatamente. Mas levantou a mão, em tom de desculpa, em silêncio pedindo para que ela continuasse.

– Eu tive muita ajuda delas duas, desde quando entrei para O Bistrô, como garçonete. Muito apoio, sempre, acho que até mais do que da minha família. Com certeza mais – Zezé se emenda.

                Mariana não disse nada. Pareceu querer falar algo, mas se conteve e permaneceu em silêncio. Aquele era o diálogo mais longo que elas já tinham mantido, desde que se conheceram, meses atrás.

– Eu me preocupo com elas e agora muito mais porque as histórias que ouço ao seu respeito não são das melhores. Desculpa, Mariana – ela sorri, um pouco constrangida – Você é que me perguntou!

– Sim, e queria saber, e agora entendi – Mariana retruca, levantando os ombros – E acho fofo da sua parte se preocupar assim com elas. Acho nobre! – ela se corrige, levantando o dedo – Minhas esposas têm sorte de ter alguém como você aqui. Fiel e dedicada.

– Parece que está sendo debochada... – Zezé sorri de novo, erguendo um pouco o queixo.

– Não estou, eu juro! – Mariana afirma, ajeitando os óculos – E não tenho o que dizer sobre as histórias que você ouviu, Zezé – ela levanta os ombros novamente, antes de mais uma vez empurrar os óculos – O que vou dizer? Aconteceu, sim, mas é passado.

– É, mas tem gente sofrendo pelas suas ações até hoje – Zezé rebate, mas logo se arrepende do comentário – Desculpa, eu...

– Não, você está certa – Mariana a interrompe – Mas concorda que nisso não tenho nenhuma responsabilidade? Digo, eu nunca iludi ninguém. Eu nunca quis me casar com ninguém, Zezé, fugia disso e todas sabem! Nunca iludi, ou menti, ou prometi algo que não cumpri. Eu juro.   

– E com a Patrícia é diferente? Com a Tati?

– Claro que é – Mariana amoleceu o corpo, ao responder – Totalmente diferente, sempre foi. Nada se compara. Tanto é que me casei com elas. Prometi coisas que jamais prometi para mais ninguém.

– Sei – Zezé fala, vendo a porta do banheiro se abrir. Viu Tatiana, surpresa por encontrar as duas ali dentro.

– Tudo bem? – ela perguntou para Mariana, e depois olhou para Zezé. Tinha no rosto uma expressão curiosa, que Zezé só tinha visto quando algo acontecia com Patrícia e Tatiana surgia em sua defesa.

– Tudo bem, amor – Mariana responde, com um sorriso – Estava aqui papeando com a Zezé.

– Sim e agora eu preciso ir – Zezé retruca, rapidamente deixando o banheiro.

– Mari? – Tatiana chama, não parecendo estar convencida quanto à normalidade da cena.

– Tudo certo, Tati. E com você, tudo bem? Está passando mal? – ela finalmente se desencosta da pia e ao esticar as costas, puxou os ombros de um jeito que estalou.

– Nada demais, amorzinha – Tatiana afirma, dando um beijo nela – Mas confesso que achei estranho encontrar você aqui, com alguém que você jura que não vai com a sua cara.

– E não vai mesmo! E agora eu sei o motivo – Mariana dá uma risadinha ao segurar na maçaneta – Depois te conto, faz aí suas coisas – ela manda um beijinho no ar e sai.

                Zezé a acompanhou a distância, indo até a escada que dava acesso ao escritório, após sair do banheiro. Mariana ficou lá em cima até o final da noite. Sozinha, porque quando estavam fechando o restaurante, a caminho de sua sala encontrou Tatiana na cozinha, junto de Patrícia. Se despediu de todos e foi a única a sair pela lateral dO Bistrô, por causa da bicicleta. Colocou o capacete no instante em que viu Mariana descer e se encontrar com as duas esposas.

                Lá dentro, o trisal ainda demorou a apagar todas as luzes e ir embora. Primeiro porque sempre ficava algum retardatário na cozinha, segundo porque Patrícia sempre tinha uma última coisa urgente para resolver, antes de ir para casa. Que dobravam quando era sábado, porque um dia inteiro longe do restaurante parecia incomodar a chef. Patrícia tinha sérios problemas quanto a se desligar e descansar.

– E aí, terminou o trabalho? – Tatiana pergunta, dando um beijo no rosto de Mariana – O que você tinha que fazer era daquele cliente que comentou mais cedo?

– Era, sim. Terminei, nossa, finalmente – Mariana responde, tirando os óculos enquanto bocejava. Parecia esta noite tão cansada quanto a esposa, que neste momento estava enfiada na cozinha, fazendo algo que não se sabia o quê.

– É, fiquei esperando você se juntar a nós... Que bom que terminou. Vai poder tirar folga amanhã?

– Vou, estou precisando – Mariana faz uma careta, espremendo os olhos ao ver Patrícia surgir nos fundos do salão, carregando uma sacola de feira em um dos ombros.

– Que bom, gata. Fico feliz, faz tempo que você não folga aos domingos... – Tatiana responde e sorri para Patrícia, antes de pegar com a esposa a bolsa listrada – Podíamos tentar dormir até um pouco mais tarde – ela apaga as luzes do lustre principal, vendo no escuro do salão Mariana dar a mão para Patrícia.

– Amanhã eu preciso me organizar com as coisas do curso, amor – Patrícia fala, antes de chegarem à porta – Já estou atrasada, se não fizer isso amanhã, vou me enrolar ainda mais.

– Que pena – Tatiana responde, trancando a porta, depois de saírem.

– Mari, sua bombinha de asma está aí? – Patrícia pergunta, assim que abre a porta do carro. Era hábito fazer esse tipo de checagem, sempre que a esposa vinha ao restaurante.

– Tá sim, amor – Mariana coloca o cinto, após assumir o volante do carro de Patrícia. Bateu a mão no bolso da calça, só por garantia.

– Mari, você não vai nos contar sobre a conversa que teve mais cedo com a Zezé? – Tatiana questiona, do banco de trás.

– Que conversa com a Zezé? – Patrícia indaga. Parecia, às vezes, que era sempre a última a saber de tudo. Especialmente (e curiosamente!) com relação ao que acontecia dentro do restaurante.

– Sim, eu fui perguntar qual era o problema dela comigo – Mariana dá partida no carro.

– Mentira! – Patrícia diz, mas ri.

– É sério? – Tatiana pergunta, no mesmo instante.

– É, ué. Eu falo que ela tem alguma questão comigo, mas vocês não acreditam em mim...

– E tem? – Tatiana estava com o corpo inteiro enfiado entre os bancos do carro.

– Tem, sim. Eu disse que tinha! Mas eu entendi o lado dela – Mariana se apressa em dizer. Sua última intenção com aquilo era jogar as esposas contra Zezé.

– Fala, garota – Patrícia pede, depois que a esposa se cala – O que foi que ela te disse?

– Mariana está toda trabalhada no suspense hoje – Tatiana resmunga, cheia de deboche.

 – Ela ouviu histórias sobre o meu passado, disse que se preocupa com vocês, que eu machuque vocês, de alguma forma. Achei bonitinho, se querem saber – Mariana responde, parecendo mais atenta ao trânsito do que ao que dizia.

– Mas... – Patrícia fala, depois de um instante de silêncio.

– Mariana e seus segredos do passado – Tatiana brinca, se recostando no banco.

– É, eu tento manter as coisas todas lá atrás, onde deveriam ficar, mas tive alguns envolvimentos que mesmo no passado ainda repercutem hoje. Está comprovado...

– Envolvimentos que não nomeia e nem dá detalhes, né – Tatiana cutuca, olhando para a paisagem fora do carro.

– É, ué. Se é passado... já foi, passou – Mariana rebate, parando num semáforo vermelho. Sorriu quando Tatiana a olhou pelo espelho, porque conhecia o tom da esposa.

– Tá, mas... – Patrícia volta a dizer – Ainda assim, alguma coisa não se encaixa. Ok que a Zezé se preocupa, mas... Não sei, vou dizer que não se justifica, mas não quero ser injusta com quem zela por mim.

– Então... – Mariana diz, abafando uma risadinha – Eu não tenho uma lista, sabe... Não tenho uma relação com cada uma que um dia eu fiquei ou deixei de ficar...

– Hum – Patrícia fala, o som dizendo tudo e nada ao mesmo tempo. Olhou de relance sobre o ombro para Tatiana, que só ergueu uma das sobrancelhas, no escuro.

– Digo, não que eu devesse... anotar os nomes, ora essa, mas...

– Fala logo, Mariana – Tatiana pede, séria.

– É que... – Mariana começa, olhando de relance primeiro para Patrícia ao seu lado, depois para Tatiana, pelo espelho – Talvez eu devesse ter falado antes, mas em minha defesa alego que eu nem me lembrava... E quando lembrei, sei lá, pareceu que já tinha passado tanto tempo que era bobagem – ela dá uma aspirada no remédio de asma, parando o carro em frente ao portão de casa – Mas...

                Mariana conclui a baliza, aciona o botão para fechar o portão e se mantém calada. Quando Patrícia acendeu a luz interna, encontrou o receio em seus olhos marejados.

– Amor, está tudo bem – Patrícia diz e olha para a esposa, no banco de trás, num convite para que Tatiana também se manifestasse.

– É, Mari. Não é novidade para ninguém que você arregaçou mil corações por aí – Tatiana ri do próprio comentário – Está tudo bem, gatinha – ela se inclina e dá um beijo em Mariana.

– Então, mas você não sabem que eu já fiquei com a Andreia – Mariana rebate e faz uma careta em seguida.

– Andreia, a garçonete dO Bistrô? – Patrícia pergunta.

– A Andreia dO Bistrô? – Tatiana quer saber, ao mesmo tempo.

– Ah, então é por isso... Vem daí a preocupação da Zezé! – Patrícia abre a porta e desembarca do carro. Parecia aliviada por desvendar o enigma – Agora tudo se explica e faz sentido.

 – É, talvez seja válido você um dia escrever uma lista, amor – Tatiana brinca, desembarcando também, cutucando a costela de Mariana.

– Uhum, posso escrever – Mariana responde, como se não falasse sério, finalmente saindo do carro – Ponho tudo de A a Z.

– Isso, aí a gente põe na estante, tipo enciclopédia Barsa – Patrícia ri.


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