Trevon

1. Trevon

Trevon, ano 8505, quinta-feira, cinco e meia da manhã. O dia começava sempre com uma sirene, estridente, que apitava por 90 segundos incansáveis e ininterruptos. O som alto, levado pelo vento seco, ecoava por todos os cantos, anunciando o despertar de mais uma manhã e o início das Horas Úteis. No período que compreendia as próximas 12 horas a circulação de pessoas passava a ser liberada, e todos tinham autorização para deixar os limites internos da área residencial da cidade. Era quando perambulavam pelas ruas sem o risco de sofrer alguma represália, praticada por agentes da lei nos horários impróprios à circulação lá fora. Durante as Horas Úteis eram realizadas apenas as abordagens, pontuais e individuais, no caso de alguém ser flagrado em atitude considerada suspeita.

Até então, a cidade lembrava o cenário de uma produção cinematográfica bem antiga, pós-apocalíptica e de fim de mundo, com imóveis que tinham apenas muros incompletos, todos pichados com riscos que se atropelavam, desprotegidos por telhados desdentados pela ação do tempo e por vandalismos variados. As ruas eram vazias e muito empoeiradas, com carcaças e sucatas de antigas aeronaves encostadas perto do meio-fio, hoje esquecidas como parte da paisagem que igualmente parecia abandonada, como tudo que se via.

Já nos segundos iniciais da sirene as ruas começavam a ganhar os primeiros movimentos, com os moradores saindo dos buracos como baratas em dias quentes, e antes mesmo que o toque cessasse a circulação já era intensa, em um dia como tantos outros. Centenas de pés marchavam em várias direções pelas ruas mormente quietas e o agito dos calçados de solado duro ia levantando o pó do chão, provocando um efeito seco de névoa empoeirada que facilmente congestionava as vias aéreas dos mais descuidados.

Havia muito tempo que, durante a madrugada, os humanos eram obrigados a permanecer na proximidade de suas residências – resumidas a pequenos espaços de 5x5m, com latrina e lavatório, sem janelas e decorados ao gosto de cada morador. Os blocos residenciais lembravam os antigos edifícios, com a diferença de terem sido construídos debaixo da terra. Eram subterrâneos, como boa parte da cidade, interligados por ruelas que lembravam formigueiros, só que um pouco maiores. Na crosta do planeta ficaram apenas os escombros dos antigos imóveis, resquícios de uma civilização passada, e as indústrias, responsáveis pela subsistência da humanidade, além de prédios oficiais como a Central do Corpo de Comando e Controle (CCC), a base da Polícia e a sede da Guarda e Administração de Trevon, uma espécie de prefeitura, comandada pelo CCC.

As construções subterrâneas foram uma tática adotada pela humanidade há alguns milênios, depois que intempéries da natureza varreram cidades inteiras do mapa, dizimando parte da população mundial. Ao menos embaixo do chão existia certa proteção contra a chuva, persistente em dez dos 12 meses do ano, e os ventos, intensos em épocas de tempestade. A ameaça de terremotos, porém, era real, mas este era um risco que se corria há várias centenas de anos. Por sorte, desde a sua criação Trevon só se desmontou duas vezes.

Essa estabilidade debaixo do chão permitiu à cidade ter certa estrutura ali, como algumas galerias centrais, largas o suficiente para duas pessoas conseguirem andar lado a lado, quase todas iluminadas por um sistema de energia eólica que fazia o dia parecer uma grande sequência de 24 horas. Ali embaixo a circulação não era restrita em nenhum horário, apesar de ser comum, eventualmente, algum policial abordar os moradores ditando regras que, todos sabiam!, valiam principalmente para o lado de fora. Mas impor respeito através do medo era uma característica da Polícia do CCC.

As ruelas estreitas levavam a becos interligados a pequenos pátios, onde o comércio ilegal funcionava na base do escambo e troca de favores. Ao menor sinal de aproximação da Polícia, os comerciantes, conhecedores exímios da região, corriam pelas vielas e sumiam. Nas bordas de Trevon, terminadas em ramificações quase labirínticas, havia locais apertados, escuros e escondidos, onde se vendiam drogas sintéticas e bebidas alcóolicas, produzidas por quem ficava lá, servindo, perto de dormitórios clandestinos, construídos em diversos níveis e em ritmo constante, destinados à prostituição. Reduto de profissionais de todos os sexos, ali nem mesmo o Corpo de Comando costumava se aproximar, então era o único lugar, praticamente do mundo, onde podia se fazer de tudo.

O toque de recolher em Trevon era iniciado sempre às 17h30, todos os dias da semana, coordenado por outra sirene, igualmente característica. Ambas eram tão elevadas que chegavam aos extremos da cidade, e mesmo além, inclusive nas regiões mais abaixo, bem ao sul. Nenhum ser vivo jamais pôde alegar dificuldade em ouvir os sons porque isso era simplesmente impossível. Inclusive porque seu volume beirava o absurdo e, enquanto soava, ninguém conseguia conversar.

Para se ter uma ideia, as crianças aprendiam a reconhecer as sirenes antes de falarem suas primeiras palavras, e se comportavam como era esperado que agissem, reproduzindo sem perceber às ordens que aprendiam em escolas profissionalizantes. À moda orwelliana, auxiliavam na fiscalização do CCC e denunciavam qualquer ato transgressor aos costumes estabelecidos. Tratava-se de uma lavagem cerebral à qual eram submetidas, logo que nasciam e se viam separadas das mães, numa tradição estabelecida há vários séculos. Já nos primeiros dias de vida passavam a ser criadas/educadas pelo sistema e reproduziam mais tarde, e naturalmente, o comportamento esperado – muitas vezes sem nem contestar.

Ao crescer, tinham a liberdade de escolher apenas o que fazer nos intervalos do trabalho, designado nos primeiros anos de vida, com base em questionários aplicados nas crianças para identificar suas aptidões cognitivas. Aí eram todas separadas de acordo com a função que seriam obrigadas a exercer até o fim de suas vidas, ou enquanto aguentassem a labuta estabelecida. Somente ao alcançar a maioridade é que passavam a sair sozinhas lá para cima, desacompanhadas de responsáveis, para se deslocarem até uma das fábricas de Trevon.

Consideravelmente poucos eram os que se rebelavam contra a quase servidão imposta, se esquivando dos serviços e se debandando para a clandestinidade, mas existiam. Para sobreviver, passavam a cometer pequenos delitos e vendiam seus corpos, muitas vezes em troca apenas da refeição do dia, ou um punhado disso. Essas pessoas eram as que mais fugiam das abordagens policiais e justamente por este motivo eram as mais visadas pelos guardas, que acessavam facilmente a ficha corrida de cada cidadão de Trevon, em tempo real.  

Qualquer atitude suspeita era motivo de prisão, que só durava cinco dias, o prazo máximo de cárcere, já que não existia crime por vadiagem. No entanto, isso não impedia o CCC de cometer abusos e humilhações contra os presos, nas dependências de seus quartéis. Para tanto, os policiais os caçavam, como se fosse um tipo de esporte bizarro. O que não faltava eram relatos desse tipo.

Se não bastasse isso, havia ainda um número máximo de prisões que cada pessoa podia ter ao longo da vida: três. Quando esse limite era excedido, muitos não voltavam para casa e o próprio Corpo de Comando era responsável por repassar o dormitório, agora vazio, para um novo morador. Os vizinhos só ficavam sabendo do ocorrido quando, de repente, outra pessoa passava a morar ali. Um estranho, que podia ser qualquer pessoa, inclusive um espião.

Os rumores murmuravam sobre uma série de situações que a pessoa desaparecida era sujeitada, incluindo torturas e experimentos supostamente científicos. Em outras palavras, o prisioneiro reincidente virava cobaia do CCC, quase um rato de laboratório, em nome do aclamado “progresso civilizatório da humanidade”, que era sempre a justificativa usada para muita coisa. Embora fossem apenas boatos, eram fortes o suficiente para incentivar os “fora da lei” a andarem na linha e evitarem, a todo custo, uma abordagem policial, que podia levá-los para este destino. Muitos por causa disso dificilmente saíam às ruas, onde era mais fácil de serem pegos, e se mantinham escondidos nas cavernas de Trevon, geralmente na parte mais escura da cidade.

Não que do lado de fora fosse muito mais claro, uma vez que a atmosfera do planeta há muito tempo se transformou em uma densa camada de poluição acumulada, que impedia os raios do sol de chegarem ao solo. Por isso, mesmo durante o dia o céu permanecia escuro, como se fosse noite; como se lá fora fosse só o interior de alguma gruta clandestina de Trevon.

Na ausência da luz artificial, alimentada pelas usinas eólicas da cidade, que eventualmente falhavam na geração de energia por alguma pane qualquer, o mundo era sempre um eterno breu, como era lá embaixo, o que dificultava a percepção do que vinha a ser dia ou noite. Eram, portanto, as sirenes tocando duas vezes por dia que ditavam o passar do tempo aos cidadãos, já acostumados a este clima, à fiscalização e também ao controle do CCC. Para os marginais, porque literalmente viviam às margens do sistema, cinco da tarde ou cinco da manhã significava apenas momentos de maior ou menor movimento nas galerias debaixo do chão, já que os trabalhadores representavam a maioria da chamada “sociedade subterrânea”. Já para os cidadãos comuns, a sirene servia para estabelecer os momentos de trabalho ou de descanso, onde acabavam interagindo entre si.

Na vida adulta, cada trabalhador tinha o direito assegurado a um dormitório e a alimentação era garantida a todos como parte do pagamento do salário, servida sempre no ambiente de trabalho. Diariamente, todos recebiam também uma pequena porção de comida, feita de milho transgênico, cultivado em laboratório e entregue em pequenas trouxinhas. O embrulho podia ser usado como complemento à refeição depois (ou nem podia, mas havia quem comia) e como era um alimento capaz de ser armazenado por alguns dias, era comum ser estocado na despensa individual de cada dormitório, em espaços projetados nas paredes para este fim. Muitas vezes, aquela espécie de pamonha acabava servindo como moeda de troca nas ruas fundas de Trevon.

A História – da cidade, do mundo, da própria humanidade – não era exatamente contada, então ninguém por ali podia se dizer saudoso de algo que não conhecia. A realidade era a mesma há muito tempo. À medida em que as guerras e suas destruições afetaram o planeta, simultaneamente aos desastres naturais de todos os tipos, muitos tão intensos que mudaram até o quebra-cabeça das placas tectônicas, sempre tão rígidas, a humanidade precisou incorporar novos hábitos para continuar existindo. Depois de afetar tanto o planeta, o homem passou a ser vítima de seu próprio habitat, em um revide monstruoso que a Terra orquestrava já há algum tempo, numa tentativa evidente de extinguir aquilo que vinha lhe causando tanto mal. Mas o humano resistiu, como sempre resistia, e passou a se esconder em tocas, em grutas, e foi assim que Trevon nasceu. Pelas contas, há pouco mais de sete séculos.

Os agravamentos climáticos resultantes das ações do homem e da própria natureza foram tão significativos que a humanidade vinha se adaptando cada vez mais a não sair para a superfície do planeta, a não ser para as obrigações diárias, como o trabalho.

No passado até haviam tentado algumas vezes instalar as fábricas no subsolo, mas as indústrias precisavam necessariamente  ficar do lado de fora, em partes por causa de suas longas chaminés que continuavam lançando fumaça tóxica na atmosfera. As histórias de pessoas vivendo integralmente do lado de fora do planeta eram tão antigas e remotas que pertenciam a civilizações muito ultrapassadas.

Hoje, Trevon já oferecia condições para que fosse possível viver uma vida inteira sem precisar respirar o ar da superfície, caso fosse necessário, pois a cidade subterrânea era bastante eficiente. Entretanto, mesmo com a possibilidade de jamais precisar sair e se afastar da área residencial, até quem não tinha uma jornada de trabalho para cumprir eventualmente saía. Estar lá fora era um sinal de coragem e destemor, além de resistência e talvez até mesmo de existência, pois estar no radar do CCC não deixava de ser também uma maneira de se provar com vida. Eram sempre saídas programadas, claro, com cada movimento na rua calculado de forma a não chamar a atenção da Polícia para uma revista, que podia ser a justificativa para uma detenção. E muito antes de começar o toque de recolher os contraventores já estavam de volta às suas tocas, debaixo da terra. Todos sabiam que não respeitar a sirene poderia ser fatal.

O alto Comando via tanto os “fora da lei” quanto os trabalhadores, essenciais para o funcionamento e manutenção da sociedade, como uma constante ameaça ao sistema. Havia inclusive quem preferisse que todos ficassem enfiados debaixo da terra o máximo de tempo possível, onde era muito mais fácil de contê-los, em caso de necessidade. Claro que essa contenção valia mais na teoria e à primeira vista, pois na prática só conhecia de verdade os labirintos de Trevon e, especialmente, o que se fazia neles, quem realmente frequentava o local, uma vez que os policiais não trabalhavam mais como infiltrados há várias décadas.

No fim, a sensação de controle do CCC muitas vezes se resumia apenas a uma impressão, disfarçada por um suposto domínio na superfície, reforçado constantemente pela força e pela violência. Muitos até diziam que o Comando era truculento apenas por ser uma entidade tão frustrada. Tão à parte da realidade.

Aqueles que se fardavam e se paramentavam com os equipamentos se valiam desta autoridade, do status, e muitos eram realmente abusivos em suas relações com a população, que os temia por vários motivos. Portanto, era o medo que continha os ânimos e não exatamente o respeito. No discurso oficial dos policiais, no entanto, todos se diziam apenas defensores da ordem, afirmando que a História provava que só assim se conseguia o pleno domínio, principalmente das pessoas e das inúmeras situações que elas criam, as diversas desinteligências com que facilmente se envolvem.  

O controle de circulação era apenas uma das diversas medidas impostas pelo CCC, que detinha o poder da cidade e comandava todas as máquinas e demais tecnologias existentes e disponíveis no planeta. Ainda que não conhecesse exatamente todos os becos e ruelas da cidade, era quem comandava todas as saídas e aberturas que existiam para esses locais, com pequenos quartéis montados próximos àquelas de maior movimento. Com seus computadores modernos, o Comando atualizava todos os dias os esboços de milhares de mapas, numa tentativa de acompanhar o desenvolvimento clandestino de Trevon.

O alto comando não tinha exatamente um rosto; era um corpo, um grupo. Tratava-se de pessoas que a população não sabia exatamente quem eram, mas que na atualidade comandavam de certa a forma a vida de todos. Os interesses que os moviam eram conhecidos apenas por eles, que se valiam da Polícia para se blindar de possíveis questionamentos ou afrontas.  

Os robôs do Comando com aparência quase humana, usados pela Segurança Nacional, eram temidos por muitos motivos, mas principalmente porque na frieza da máquina conseguiam ser ainda mais impetuosos que os policiais de carne e osso. Apesar de o CCC afirmar o pleno controle sobre os robôs policiais, a população se afligia e desconfiava que muitos eram programados para matar, ou então o domínio sobre eles não era integral, como o Corpo de Comando dizia. As suspeitas se fortaleciam, especialmente, por causa dos vários assassinatos injustificados cometidos por esses robôs, que se fardavam exatamente como os policiais humanos.

Todos em Trevon conheciam as histórias transmitidas de geração em geração, desde o final dos anos sete mil, que contavam sobre como o homem quase perdeu o controle sobre as máquinas, em uma guerra que durou meio século e justificou o poder do CCC depois que, supostamente, a Polícia dominou os robôs exterminadores, usados hoje pela própria corporação. Porém, o receio de que a história se repetisse perturbava a todos, pois se isso acontecesse a humanidade certamente seria exterminada desta vez. Aparentemente alheio a estes receios, porém, o Corpo de Comando comandava as pessoas com as mesmas máquinas que, por muito pouco, não dominaram a todos, em um passado perigosamente recente.

Para tanto, e para garantir o seguimento das regras, eram oferecidos aos cadetes da Polícia do CCC vários anos de uma rígida formação, incluindo um treinamento de condicionamento físico ostensivo, além da oportunidade de uma série de adaptações cirúrgicas e robóticas, que podiam ser implantadas em qualquer parte do corpo para melhorar o desempenho e a performance como um todo. Fora, é claro, os vários semestres dedicados exclusivamente à montagem, desmontagem, manutenção e domínio dos robôs e demais tecnologias, de onde saíam os novos “gênios” da Inteligência do CCC.

O grande trunfo do Comando, no entanto, sempre foi seu vasto banco de dados, repleto de informações de todos os tipos. O controle é sempre mais efetivo quando se conhece aquilo que se está fiscalizando. As fichas que acompanhavam as fotos dos considerados insurgentes eram longas e armazenadas secretamente em arquivos acessados apenas por policiais, literalmente, em um piscar de olhos. Mesmo quem não era fichado tinha um inventário e por acreditarem em teorias retrógradas e higienistas, os arquivos policiais traziam sempre como anexos os históricos familiares dos violadores. Esta era uma tentativa de comprovar que a desobediência, assim como a rebeldia, podiam ser características genéticas.

Em Trevon, a hereditariedade ditava cada uma das divisões de classe. Do mesmo modo que se supunha que a contravenção era uma herança familiar, acreditava-se que a força policial seria mais efetiva se sua linhagem fosse “pura”. Assim, todos do CCC descendiam de outros policiais.

Esses agentes, como todas as crianças de Trevon, eram tirados das mães logo que nasciam. No entanto, diferentemente das demais, reconheciam mais tarde seus genitores nos corredores da corporação, embora não houvesse qualquer tipo de laço emotivo ou social. Alguns podiam até se tornar parceiros de seus pais, dependendo da função que exerciam, determinada pelas alterações a que submetiam seus corpos durante os anos de treinamento e formação.

A policial A-348 era uma dessas pessoas. Crescida, criada e educada na disciplina da corporação, reproduzia o papel ao qual estava destinada pensando pouco ou quase nada nos benefícios que tinha porque, focada em sua rotina desgastante, muitas vezes tudo o que conseguia ver era suas próprias dificuldades, que a muito custo ela sempre tentava superar.  

Ser do CCC, aparentemente, trazia algumas vantagens, mas era principalmente uma vida recheada de desafios difíceis e cansativos, e constantes, num mundo caótico de trabalho vigilante. A-348 se cobrava bastante e por isso trabalhava muito, sempre comprometida a bater seus próprios recordes de rendimento. Como resultado de sua alta exigência, vivia sob intenso estado de nervos, estressada, enfrentando sozinha longas crises de ansiedade. Secretamente, em muitas de suas noites em claro ficava imaginando como seria se tivesse a coragem (e a ousadia também) de descer até o fundo de Trevon só para comprar alguma droga que sabia que era vendida por lá. Acabava pegando no sono se deliciando com o pensamento.

De seu grupo de formação, dos que a antecederam e daqueles que a sucederam, era a única policial que até hoje jamais fez qualquer alteração corporal, o que influenciava diretamente na ansiedade e causava sérios problemas de socialização. A-348 era vista pelos colegas quase como uma aberração, com seu corpo normal, aparentando tanta “fragilidade”. Diziam que ela se assemelhava com aqueles que viviam sob o comando do CCC, destoando-se dos homens da lei que mediam, muitas das vezes, até três metros de altura, com braços e pernas mecânicos comandados por sistemas implantados nos cérebros. Eram humanos com capacidades potencializadas, similares, e talvez até superiores, às das máquinas que, por sua vez, pareciam tão humanas quanto ela própria, que de robô só tinha o traje da Guarda.

Apesar da constante e gritante deslealdade física em relação aos demais, A-348 sempre foi muito esforçada, tentando a todo custo se destacar no trabalho, ainda que isso fosse bastante difícil e cansativo, e até impossível, dependendo do caso. Hoje mesmo era para ser seu dia de folga, o único no mês, mas quem é que consegue descansar quando há a sensação de um dever a se cumprir? Ou uma investigação para conduzir?

Ela definitivamente não conseguia e por isso abriu a porta do seu dormitório assim que a sirene começou a tocar, pontualmente às 5h30. Já estava pronta, aguardando o momento que pudesse sair, vestida com seu traje policial, uma proteção robótica que lembrava as armaduras do século XIII. A diferença eram as luzes que piscavam na parte da frente e de trás da peça, e o fato de que era inteira à prova de balas e contra objetos cortantes. Embora ficasse quase 30cm mais alta (o que lhe conferia cerca de 1,95m), os policiais robôs se destacavam de A-348, mesmo de longe, com seus 2m. Também usavam uma proteção igual à dela, como se fossem igualmente humanos dentro dos trajes especiais. O que os diferenciava era apenas o sistema, que os reconhecia como máquinas a serviço da Polícia, simplesmente. Por fora, eram quase idênticos – mais um motivo para A-348 ser caçoada.

O equipamento a cobria praticamente dos pés ao pescoço e a cabeça ficava protegida pelo capacete, o visor escuro preservando sua identidade lá dentro. Assim que sai no corredor, um detector de longo alcance passa a projetar à frente de A-348 informações úteis para o seu trabalho, disponíveis no sistema do Comando e acessado pelos policiais por telepatia cibernética, uma evolução tecnológica disponível apenas para agentes da lei.

Como todos, a policial tinha um chip na nuca, agora escondido pelos cabelos castanhos, inserido no dia em que nasceu e foi cadastrada no sistema do CCC como A-348, descendente de S-4312 e GS-907. O implante pareava com tecnologias básicas de comando, mas era insuficiente para operações mais complexas, por exemplo, acessar o sistema oficial, fortemente protegido para evitar qualquer tipo de invasão maliciosa. Isso a tornava dependente do capacete e, sem a peça, era como se A-348 fosse cega perto dos demais, que o usavam apenas para proteção e para resguardar suas identidades, uma vez que tinham tecnologias mais avançadas implantadas na cabeça.

Antes do primeiro passo, A-348 repassa a lista de ações que teria pela frente, tomando o cuidado de deixar sua insígnia dentro do dormitório. Para a apuração que tinha planejado para aquela manhã, o objetivo era passar despercebida, de preferência até ser confundida com algum robô, vestido como ela e igualmente sem identificação visível. Todo o cuidado era para que sua comandante não soubesse o que estava fazendo e queria menos ainda que algum cidadão comum mais tarde pudesse reconhecê-la, caso algo desse errado e fugisse de controle. Ao fechar a porta, um bipe a alertou de estar se afastando de seu distintivo e ela deu o aceite na tela que surgiu diante de seus olhos, projetada pelo capacete.

– Estou ciente e quero continuar – resmungou, fazendo um movimento com a mão, para o alerta sumir de vista.

Com um gesto, sutil, levou a mão direita à cintura apenas para se certificar de que sua pistola estava ali e mais abaixo encontrou, com a ponta dos dedos, o cassetete e o escudo, comprimidos do tamanho de um lenço, dentro de uma espécie de bolso. Esperava que não precisasse usar nada daquilo, mas deu duas batidinhas de leve na perna esquerda, perto da coxa, para verificar se as bombas de efeito moral e as granadas paralisantes estavam ali. Não fez mais nenhum movimento quando se virou e começou a caminhar, deixando para trás a porta de sua residência. Não queria chamar a atenção de ninguém que passava por ali, também a caminho do elevador.

A fila a esta hora já estava grande, mas os elevadores subiam muitos metros em poucos segundos, então A-348 nem chegou a ficar parada enquanto aguardava. Subiu com outros 12 policiais, o sistema mostrando que mais da metade ali dentro não era robô, mas nem precisava: muitos quase alcançavam o teto, consideravelmente alto. No CCC, quanto menos parecesse, mais humano o policial era.

Embora fosse bem cedo, a sirene ainda estava soando quando o elevador chegou ao térreo e abriu as portas, A-348 encontrou as ruas já bem movimentadas. Este era o primeiro horário do dia em que os habitantes de Trevon se encontravam, numa agitação costumeira que desembocava nas fábricas, localizadas nas partes mais elevadas da cidade. Nesta época do ano o clima era cruelmente seco e a poeira levantada pelos pés agitados cobria os uniformes de cores diferentes com um pó marrom e insistente, criando no ambiente uma penumbra típica, com um cheiro igualmente característico.

Por vários motivos, mas principalmente por medo, conforme A-348 avançava as pessoas se distanciavam, abrindo passagem para a policial no meio da massa humana que ia e vinha em vários sentidos. Quase todos vestiam os macacões tradicionais das fábricas, que tinham as cores de acordo com o tipo de local a que se dirigiam. Variavam entre vermelho, laranja e salmão, todos muito diferentes dela, que vestia um traje todo preto e blindado, com o logo grande do Corpo de Comando e Controle na parte de trás. Lá dentro, A-348 era apenas uma mulher, com sua identidade e um rosto. Mas para todas as pessoas na rua ela era exclusivamente um símbolo de repressão e até de violência, adjetivos que serviam como sinônimos do CCC.

Seu capacete seguia projetando, sempre que movia o rosto em alguma direção, detalhes que claramente não faziam parte do cenário, como a ficha corrida de todos os rostos que cruzaram seu caminho, os incidentes registrados em cada um dos imóveis depredados pelos quais passou em frente e até a tradução simultânea de uma conversa entre dois suspeitos, três esquinas adiante, que se calaram assim que perceberam a policial vindo em suas direções. A atitude esquisita obrigou A-348 a manter a postura ao passar pelos homens, lendo rapidamente na tela os delitos de cada um, avaliando em poucos segundos a conduta que teria a seguir.

Sempre que alguém era alcançado pelos sensores do capacete, o visor piscava e no canto à direita aparecia a ficha da pessoa, incluindo todo o seu histórico, não apenas policial, mas de vida também. Contra aqueles dois, A-348 viu que não havia nada de grave. Provavelmente em outra ocasião teria parado para revistá-los, mesmo o scanner mostrando que estavam desarmados, só porque gostava da adrenalina de encurralar cidadãos que, ao seu ver, mereciam a abordagem. Para a policial, bastava o fato de ser homem para se tornar suspeito, ou para justificar uma revista, e sua última preocupação nessas horas era com a integridade física do abordado. Ela era bruta, mesmo, muitas vezes agia de maneira até desproporcional, mas A-348 jamais admitiria nada disso em voz alta. Para disfarçar, eventualmente até jogava algumas mulheres contra a parede também, mas geralmente com menos força, a não ser que merecessem.

Porém, aquele era um dia especial e ela estava determinada a cumprir sua tarefa sem atrair a atenção de ninguém. Não desejava nem mesmo o registro de ocorrências mais simples, como revistas a transeuntes, automaticamente notificadas no sistema. Estava de folga, afinal. Por isso, manteve o ritmo dos passos, o corpo já acostumado ao peso do traje, a mente habituada ao anonimato oferecido pelo uniforme, que  mantinha a salvo seus órgãos vitais, todos em pleno funcionamento nesta manhã, com a expectativa do serviço.

O mapa no canto da tela projetada mostrava um trajeto tracejado, atualizado a cada novo passo, mas A-348 seguiu determinada pelo meio da rua empoeirada sem olhar para o roteiro nem uma única vez. Não precisava. Conhecia o caminho de cor, pois tinha feito aquele itinerário em sua cabeça repetidas vezes. Virou hábito estudar o percurso, algo que começou a fazer há exatamente um ano, completado hoje, nesta manhã. Foi quando o protesto, que acontecia anualmente na mesma praça, chamou sua atenção.  

Era para lá que estava indo agora, com os batimentos cardíacos agitados, monitorados e exibidos em tempo real.

Naquele mesmo dia, um ano atrás, estava de plantão na Central lidando com o trabalho burocrático que, quase sempre, sobrava para ela despachar, quando reparou no monitor principal e em todos os outros a ausência de imagens de drones que deveriam estar fiscalizando a região central de Trevon. Seu faro policial logo indicou que algo estava errado e A-348 dedicou horas de trabalho a isso. Foram três dias até descobrir, sozinha, que alguém havia conseguido invadir o sistema do Comando e tinha desviado de maneira criminosa todos os drones que deveriam vigiar, justamente, a rota daquele protesto.

Ela sabia que todo acesso ao sistema deixava como rastro o ID de quem fez o login, fosse para os comandos simples, fosse para ações mais complexas, como desviar a rota de 20 drones. Entretanto, no caso específico esses dados eram inexistentes, o que fez com que A-348 desconfiasse que ou o criminoso conhecia alguma brecha, que mais ninguém sabia, ou tinha conhecimento suficiente para apagar muito bem seus rastros, o que, tecnicamente, era impossível.

Frustrada, precisou reconhecer que o invasor era bom naquilo e se irritou por ele saber mais do que ela, fazendo com que perdesse longas e valiosas horas de descanso. Ao final da investigação prévia, A-348 passou a alimentar duas hipóteses. A primeira era a de que a rede não era tão segura como se acreditava e a segunda, mais óbvia, era de que algum policial estava traindo os interesses da corporação. Aquelas pareciam as únicas explicações possíveis para o ocorrido, uma vez que ninguém fora do Comando tinha equipamentos capazes de efetuar esse tipo de invasão e só na academia se recebia treinamento para manipular qualquer tipo de aparelho eletrônico, o que descartava algum ataque externo. Cidadãos comuns jamais conseguiriam tal feito.

No entanto, não podia bater na porta de sua superiora apenas com uma suspeita e isso era tudo o que tinha, mesmo depois de milhares de horas revendo todas as questões ligadas àquilo. No fim, A-348 não encontrou nenhuma prova ou evidência e só não desistiu da investigação completamente porque durante todo o ano continuou revendo e reanalisando tudo o que já sabia sobre o assunto, e aguardou um ciclo anual inteiro até que novamente fosse dia 05 de maio. Algo lhe dizia que outra ação ocorreria, mas mais por intuição, porque de maneira concreta não tinha encontrado relação alguma que envolvesse a invasão ao sistema com o tal protesto popular.

Mas dessa vez pelo menos ela estaria lá. Acompanharia com seus próprios olhos, ao vivo, registrando as cenas no seu próprio sistema. Colheria in loco todas as provas que pudesse apurar, seria testemunha ocular de qualquer incidente que porventura acontecesse. Era por isso que precisava do sigilo, do quase anonimato e perdeu duas folgas por querer programar aquela. Há quase três meses sem descanso, A-348 torcia para que valesse à pena, apesar de, às vezes, achar que era só a empolgação do momento que a deixava tão confiante de que flagraria algo nesta manhã. Só não se criticava porque não era de todo ruim ter expectativas boas num trabalho que a desgastava tanto. Bem ou mal, investigar tudo isso por tantos meses tinha servido como uma boa distração para seus dramas e problemas cotidianos.

Encostou em uma das esquinas da praça, parando do jeito que outros três robôs próximos dela estavam posicionados, inclusive a mão, sistematicamente posicionada perto do coldre na altura da cintura, o indicador um pouco mais esticado que os demais dedos. As máquinas eram uns 5cm maiores que ela, ainda que se esticasse bem, algo que costumava passar despercebido pelos civis, mas não para a policial, que sempre se espichava perto dos robôs para parecer maior.

Embora estivesse sem identificação visual, já que tinha deixado o distintivo no dormitório, A-348 reconheceu no sistema e foi imediatamente reconhecida pelos outros policiais. Reparou então que apenas ela era humana em todo o grupo fardado. Aquele era um trabalho que podia ser automatizado, segundo afirmavam, mas ela tinha ressalvas e eram várias envolvendo a tecnologia. Em uma olhada rápida nas fichas dos colegas, nas fotos projetadas pelo capacete, viu que pelo menos dois deles pareciam até mais humanos do que ela. O que sempre a impressionava era a riqueza de detalhes. Os robôs tinham sobrancelhas! Ela já tinha visto um com rugas.

Piscou rapidamente para as informações sumirem e se concentrou no começo de aglomeração que se formava perto do que um dia foi um coreto. Com o olhar, organizou as novas informações para ficarem à direita da tela, como a ficha criminal de todos aqueles captados pelo sistema, e pelo lado esquerdo do visor do capacete permaneceu atenta à movimentação que era, como esperado, composta integralmente por humanos. A cada pessoa focada a imagem projetada pelo capacete ganhava destaque, mostrando o resultado do escaneamento corporal. Por costume, contou quantos robôs havia em volta da praça: 27. Certamente tinha pelo menos mais três, bem escondidos, pois sabia que 30 era o contingente mínimo para eventos como esse tipo de protesto. Não confirmou a informação porque era mera formalidade e não perdeu tempo procurando por esses agentes.

Quando o relógio marcou 5h45 A-348 puxou, com o comando de piscadas, a imagem de satélite que apontava em tempo real todos os drones de controle que sobrevoavam a área. Acessou a imagem de alguns só para ter certeza de que estavam funcionando corretamente e confirmou que todas as rotas permaneciam inalteradas. Ao menos, desta vez, não haveria desvios de drones.

No meio das pessoas que se aglomeravam para o protesto, A-348 viu uma jovem com o rosto coberto por um tecido marrom. Muitos usavam proteções parecidas, mas a mulher se destacava por algum motivo. Na tela logo apareceu a longa lista de Júpiter, uma manifestante conhecida por contravenções leves, integrante assídua dos protestos de 05 de maio. A-348 sabia bem de quem se tratava, pois Júpiter estava em quase todas as fotos que a policial estudou da manifestação do ano anterior e, de tanto ver seu rosto, seria capaz de reconhecê-la mesmo sem a ajuda do sistema de identificação, que não apontava o nome de seus pais biológicos. A manifestante era registrada como órfã, criada nos reformatórios responsáveis pela educação de tantos outros como ela, muito parecidos com os que a própria policial fora educada, ainda que voltados para outra área. Secretamente, A-348 acreditava que o problema da sociedade era justamente esse. As pessoas já nasciam desprovidas de qualquer tipo de amparo e provavelmente por isso cresciam revoltadas com a vida e contra o sistema. Para ela, eram o puro resultado do desamor.

A-348 notou que Júpiter fazia algum tipo de discurso, ao perceber que as pessoas começaram a se reunir em volta dela para escutá-la melhor. Puxou com o olho o comunicador e conseguiu captar o final do que dizia. Por falar muito baixo, a policial precisou gerar uma legenda junto com o áudio obtido.

― ... todo cuidado é pouco, sempre – Júpiter falava de maneira quase inaudível ― Há cem robôs aqui hoje ― ela fez um gesto com o dedo indicador em riste, circulando no ar ― Tem guarda humano também, amigos ― a mulher afirmou e quase pareceu olhar na direção de A-348 ― Os senhores se lembram do que aconteceu dois anos atrás, não queremos nada parecido com aquilo. Infelizmente, o feito do ano passado não pode ser repetido, mas... queremos um show diferente desta vez! – complementou, rindo.

Apesar de ter estudado bastante o evento anterior, A-348 não tinha dado muita atenção ao ocorrido antes disso, dois anos atrás. Deixou de lado depois de verificar que nada de anormal tinha acontecido, mas a menção da jovem a fez acreditar que algo havia passado despercebido. Acessou rapidamente o sistema e minimizou a tela com as imagens dos manifestantes apanhando da Polícia naquele mesmo local, mais de 700 dias atrás, permanecendo de olho no grupo que agora se agitava um pouco na praça, entoando baixinho alguns gritos de guerra. A-348 ficou pensando em como Júpiter poderia saber quantos robôs estavam no ato e na atualização do quadrante daquele perímetro verificou 101 policiais contando com ela, que ainda era a única humana.

De repente, brecou todos os pensamentos porque um movimento na tela minimizada chamou sua atenção. Aumentou algumas polegadas apenas para ampliar a imagem do protesto retrasado, viu a tropa de choque cercando os manifestantes no muro e no meio da fumaça alta das bombas caseiras estava Júpiter, parada no meio da praça, com o olhar sereno, parecendo até sorrir. Ela olhava para o lado, como se avistasse alguém conhecido.

Congelando a tela, a policial anotou mentalmente a minutagem daquela gravação e salvou o vídeo numa pasta onde armazenava seus documentos pessoais. Teria que mapear a área naquele dia específico e puxar as imagens antigas de todas as câmeras de segurança e dos drones, traçando para o foco do olhar da manifestante, naquele exato instante. Por ser um trabalho demorado, optou por se concentrar no que acontecia agora e depois vasculharia com calma as imagens antigas. Quem sabe até o almoço teria o caso todo resolvido. Minimizou todas as telas com um movimento com o olho e voltou a ter o visor do capacete desimpedido para o que ocorria, ao vivo.

A policial esperava um protesto atípico. Talvez até aguardasse por algo estranho, até para não se sentir frustrada depois de um ano inteiro se programando para aquele dia. A-348 havia passado muitas noites em claro pensando no que mais seria capaz de fazer a pessoa que teve a audácia de desviar os drones do Comando no protesto do ano anterior. Acreditava que esse alguém era capaz de tanta coisa que até se perdia nos pensamentos!, perdia o sono.

Assim que deu 6h um bipe baixinho avisou a hora no comunicador e seus olhos varreram toda a praça, ansiosos, atrás de algo que fosse suspeito. Qualquer coisa bastava. 

A praça, na verdade, era apenas um campão a céu aberto, ladeado por uma calçada safada, toda esburacada. O espaço outrora foi ladrilhado e ornamentado, inclusive com jardins, mas hoje era só um cercado, cujo chão era uma placa de metal revestida com cimento batido, marrom por causa da poeira incessante e pegajosa que só sumia nos meses de impiedosas e torrenciais chuvas, que transformavam toda aquela poeira em lama.

Em todas as quinas da praça eram visíveis quatro torres de controle, bem altas, com um robô no topo de cada uma. Todas eram fortemente equipadas com artilharia, como pequenos fortes que guardavam equipamentos de guerra acessíveis aos policiais, alertados em caso de necessidade e urgência.

Para sua completa eficácia, porém, era preciso que todo o sistema de vigília funcionasse como deveria, alertando os policiais sobre possíveis riscos, o que não parecia ser algo garantido, considerando o desvio dos drones no ano anterior. O receio de A-348 era justamente esse: quem acessava uma rota de drone podia alterar qualquer outra coisa. Inclusive o comando que abre as portas dessas torres, destravando armas de alto poder letal.

Mas A-348 não se demorou nesses pensamentos porque, na expectativa de ver alguma anormalidade acontecer durante aquele protesto, quando algo estranho finalmente aconteceu ela estava tão despreparada que perdeu longos segundos tentando entender o que ocorria à sua volta.

E foi justamente a surpresa seu maior fator de vulnerabilidade, no meio da balbúrdia que se instaurou naquela praça.


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