Indireta

Eu não gosto de indiretas. Não gosto, sério, acho falta de maturidade de quem lança e sempre falta compreensão de quem no fim acaba recebendo a mensagem (que, vale dizer, quase nunca é o alvo da indireta em questão). De verdade, eu gosto de tudo bem às claras, aprecio o jogo limpo e a inteligência emocional de quem saber ser direta e reta em suas análises, conjecturas e observações, porém sem ser discreta no momento em que expõe suas opiniões sobre um fato ou alguém, que em geral é o alvo.

Pessoas são complicadas. Ponto. É importante partirmos dessa premissa. E o fato de serem complicadas dá muita margem para desentendimentos, discussões e situações variadas que nos tiram do sério, embora isso em momento algum se torne engraçado de alguma maneira. Só que o problema é que no meio desse balaio há quem não tenha noção alguma sobre nada, que são aquelas pessoas que até têm contato com a indireta que é direcionada para elas, mas a falta de senso as impede de entender a referência, de que aquele é literalmente seu local de fala (ou seria “local de escuta”?). Por outro lado, há pessoas que até são espertinhas, mas não tanto quanto quem deixa de dizer as coisas “na lata”, o que acaba criando a brecha para a indireta – pelo simples fato de se evitar a fadiga que sempre é gerada em qualquer tipo de confronto, inclusive os verbais.

Ou seja, embora muita gente mereça levar uma indireta bem no meio da fuça, que a depender do caso tem o potencial de um verdadeiro soco, há muitas outras que não têm a coragem necessária para simplesmente “fazer a braba” e mandar a real. Ou o que falta é a disposição para uma briga e essas pessoas acabam levando fama de covardes, não sei bem... Só sei que é assim que surgem as indiretas, que podem ser marolinhas ou como um furacão. Tudo depende se o objetivo foi cumprido ou não.

Nos últimos dias tenho me segurado para não brigar, primeiro porque tenho mais o que fazer, ando cheia de trabalho, segundo porque seria um pouco infantil da minha parte ir lá cutucar quem está quieta, ainda que eu tenha a certeza absoluta de que provocações estão sendo feitas a todo momento, no puro intuito de me irritar. Quer dizer, isso é o que eu me falo e me reafirmo a cada instante, mas o fato é que o ranço contra certas pessoas tem sempre força suficiente para distorcer completamente a realidade, nos levando a acreditar naquilo que não existe. Ou que até existe, mas em menor escala.

Essa distorção causada pelo ranço, que cria uma desconexão com a vida real, é um fenômeno muito interessante que não tem nada de científico, mas que ainda assim deveria ser objeto de estudo nas universidades. Afinal, deveríamos saber mais sobre os processos que nos levam ao auge de ficarmos incomodadas pelo simples fato de que alguém está respirando, ou existindo. Porque, para mim, é o ranço que está por trás de muitas indiretas (mas falo isso sem embasamento algum, com base apenas no meu achismo e nas análises que faço quando estou entediada).

Se por acaso eu fosse adepta das indiretas, você com certeza já teria visto várias mensagens minhas aparentemente “sem sentido”, porque só poderiam ser decodificadas pela receptora que eu escolhi detestar. Ou melhor, que a vida me forçou a desgostar! Pessoas são complicadas, eu disse, e me incluo nessa porque ainda não virei uma alce... Inclusive esse ano está sendo particularmente importante nesse sentido, porque tem destacado bem cada uma das minhas deficiências e fragilidades, considerando que eu consegui brigar com absolutamente todas as pessoas do meu entorno/convívio. Na minha última corrida, enquanto me arrastava pelas ruas da cidade fingindo correr, frita por causa do sol, pelo calor e devido aos meus pensamentos intrusivos, no final do percurso (de 21 quilômetros, vale dizer) cheguei à sincera conclusão de que claramente o problema sou eu. Mas isso em momento algum quer dizer que os demais envolvidos nos meus dilemas sejam santos, porque não são e estão bem longe de ser. Talvez, quem sabe, eu perca um pouco a razão por ficar tão brava com coisas que dizem não ser “nada demais”, mas isso não exime absolutamente ninguém da responsabilidade de ter me deixado nesse estado (eu sou muito reativa, muito).

Então eu poderia perfeitamente lançar a torto e a direito uma metralhadora de acusações, reclamações e julgamentos, que faço sempre em demasia, até sem querer, às vezes. Porém, para a sua sorte (e minha, também), minhas indiretas se resumem a frases soltas como “aff, que tosca”, que eu disparo sem perceber quando estou sozinha, logo depois de um gatilho imaginário. Ou ao menos se resumiam, até essa crônica ser criada.

Honestamente, acredito que quem deveria ler tudo isso não vai nem chegar perto, porque existe um ranço mútuo entre mim e aquela que me instigou a escrever essas palavras. Mas foda-se, não estou nem aí se vai ler ou não porque a minha parte, sinceramente, eu já fiz: bloqueei em todas as redes sociais, parei de seguir nos aplicativos e me blindei de ver tudo que possa de alguma forma me desestabilizar ao ponto de me fazer querer mandar uma invertida, uma indireta ou um soco literário com palavras rudes que, não se engane, eu sei muito bem aplicar. E para finalizar, tomei o cuidado de elaborar este texto só para dizer que meu silêncio diante da minha irritabilidade não significa nada além de “estou cagando para isso”. Foi a maneira que encontrei para te dizer que não estou nem aí para você.


Essa crônica pode ser ouvida: ouça caribu.


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