A história do passarinho

 Era uma vez um rebanho de lindas e gordas vaquinhas e todas viviam juntas e felizes num verdejante pasto, cada uma com a função de cuidar de sua própria vida e ser feliz.

Por hábito, todos os dias, ao entardecer, o grupo se reunia no cume de uma montanha careca para acompanhar o espetáculo do pôr do sol. Nesses momentos de interação aparentemente saudáveis, contabilizavam-se os feitos do dia, conforme a noite vinha: faziam questão de prestar contas de quantas gramas cada uma tinha comido, quantos litros de água bebido.

Ai daquela que poupasse – a si mesma e aos recursos, tão fartamente acessíveis. “Mão de vaca” era o termo mais leve que surgia nessas horas! Obviamente que a vaquinha que mais consumisse ao longo de um dia inteiro, o que quer que fosse, ganhava um notório destaque no meio do bando. Aí, a cada dia, ou melhor, a cada noite, mugiam baixinho, em admiração, reproduzindo os feitos da vaca mais consumista.

Tudo ia bem até que em certa ocasião, mais ou menos por volta das cinco, estavam as vaquinhas a caminho do cume quando perto delas caiu do alto de uma árvore um filhote de passarinho. Um pardalzinho, desses bem comuns. Penalizadas e com forte senso de união, as vaquinhas passaram a criar o passarinho como se fosse um delas, incutindo na vida do bichinho o hábito de ver o sol se despedir desse lado da Terra, dando lugar ao brilho da noite, via estrelar.

O passarinho, sem pensar muito nesses assuntos, embora sempre com o tema às voltas de sua pequena mente, cresceu com as vacas, sem nunca voar. Vaca não voa, afinal.

E o tempo passou, e ainda que houvesse muito amor – e havia!, bastante! – um dia ficou claro que passarinho tem outras urgências além do consumir. Por exemplo, o ir e vir. Ou, neste caso específico, o livre voar.

Um ninho, mesmo muito confortável, nem sempre nos cabe – e tudo bem! Prova disso é esta singela história, do passarinho que um dia descobriu que não era gado.  

 

Essa crônica pode ser ouvida: ouça caribu.


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