Notas do dia de hoje
Saí
para dar um rolê com a minha cãzinha. Não queria, há dias que não saímos,
estamos ultimamente ainda mais enclausuradas dentro de casa, por causa do frio,
cobertas com um desânimo que, olha, se eu fosse te contar, ficaríamos aqui até
amanhã. Mas é normal, dizem, o mundo está mesmo meio assim – e como não estar,
ainda mais morando no Brasil? Eu nem vacinada fui, estou aqui no limbo entre os
assintomáticos e os mais velhos, já vacinados. Mas, tudo bem, vejo dia após dia
o meu instagram se encher de fotos de amigos sorridentes, segurando cadernetas
de vacinação. Minha vez está chegando.
Mas,
óbvio, isso não significa também que só por isso está tudo ótimo porque, mesmo
me isolando, as notícias chegam (minha vizinha mesmo me atualiza sobre a CPI todo
dia, na hora do almoço). E sinceramente, tudo bem não estar bem. Olha para o
que a gente está vivendo!
Eu
sempre me vigio o máximo que posso, e consigo, e tento não deixar as bad durar
muito tempo, mas há muito que parei também de me fiscalizar quanto a não estar
bem em certos dias. Antes da pandemia já existiam esses dias, normal que existam
agora também. E parar de me cobrar foi muito libertador porque já me bastam
todos os outros pesos.
Essa
semana tem sido de dias ruins, mas parece até absurdo falar isso, estando
sozinha dentro de casa, com comida na geladeira, tendo saúde. Mas têm sido
daqueles dias que acordo (sete da manhã, desperta, mesmo com a névoa lá fora
dos 12 graus que o termômetro marca) e sinto uma vontade sincera de não fazer
absolutamente nada. Não quero trabalhar, não quero escrever, não quero ver
televisão, não sinto nem fome. Se deixar, passo o dia olhando para as árvores
lá fora da janela, balançando com o vento, os passarinhos que passam voando
alheios ao meu tédio, as nuvens que nem têm formato de nada. Não sinto ânimo
para sair e andar com a Nani, e cachorro é sempre muito parecido com o dono, então
a Nani tampouco quer sair.
Enquanto
muitas pessoas engordaram na pandemia, eu emagreci e a Nani envelheceu (duas
décadas só de começar a usar roupa). Em outros tempos, ela me obrigaria a sair,
e eu sairia mesmo sem vontade (ela sempre ficava chorando, olhando para a minha
cara, quando decidia dar rolê antigamente – ano passado). E velho, sabe como é,
não é lá cheio de muita energia...
Juntou
a Nani e eu, e o resultado foram alguns dias sem dar o nosso tradicional rolê
na florestinha. Mas hoje fomos, porque né, tem que sair. E vou te contar que
foi a melhor coisa que fiz, porque o caminho está cheio de flor, e as árvores
também, e até o ar, porque o vento bate e as florzinhas caem, e voam, muito
bonito. Fiquei um bom tempo embaixo de uma dessas árvores, olhando para cima,
encantada com a energia que vinha ali dos galhos, que caía sobre mim em
graciosas forminhas de rosa claro. Alguém de carro passou e disse “tá bonito!”
e eu precisei concordar – e olha que detesto interações na rua.
Fiquei
feliz por ter saído e ter sentido a Mãe Natureza, que sempre acolhe, me
abençoando, à sua maneira!
Um
tempo atrás, quando ainda estava na faculdade, fiz um jornalzinho para o
Alcóolicos Anônimos da minha cidade, para uma disciplina chamada Jornalismo do Terceiro
Setor. Naquela época (isso foi mais ou menos em 2005), fiquei encantada com a
filosofia do “só por hoje”, bastante usada pelas pessoas que lutam contra o
vício. Alcoolistas em tratamento adotam a vigia da sobriedade por 24h – é curto
prazo. Se pensar em longo prazo é mais fácil de desistir, parece impossível
pensar em nunca mais consumir álcool, e mais fácil pensar em não beber só
por hoje.
Hoje,
tenho recorrido a essa filosofia, tanto tempo depois. Só por hoje!
Esse
papo me fez lembrar um poema do Drummond, que eu gosto muito, chamado “O Tempo”.
Termino essa crônica com o poema, e com um trechinho da oração da serenidade, que conheci no
A.A., e que sinto estar precisando.
O Tempo
“Quem
teve a ideia de cortar o tempo em fatias,
a que se deu o nome de ano,
foi um indivíduo genial.
Industrializou a esperança,
fazendo-a funcionar no limite da exaustão.
Doze meses dão para qualquer ser humano se cansar
e entregar os pontos.
Aí entra o milagre da renovação
e tudo começa outra vez, com outro número
e outra vontade de acreditar
que daqui para diante tudo vai ser diferente.
Para você, desejo o sonho realizado,
o amor esperado,
a esperança renovada.
Para você, desejo todas as cores desta vida,
todas as alegrias que puder sorrir,
todas as músicas que puder emocionar.
Para você, neste novo ano,
desejo que os amigos sejam mais cúmplices,
que sua família seja mais unida,
que sua vida seja mais bem vivida.
Gostaria de lhe desejar tantas coisas…
Mas nada seria suficiente…
Então desejo apenas que você tenha muitos desejos,
desejos grandes.
E que eles possam mover você a cada minuto
ao rumo da sua felicidade”
(Carlos Drummond de Andrade)
Oração
da serenidade
Deus, conceda-me a
serenidade
para aceitar as coisas que não posso mudar,
a coragem para mudar as coisas que posso
e a sabedoria para discernir uma da outra.
Vivendo um dia de cada vez,
apreciando um momento de cada vez
[...].
Resistimos!
Use máscara! E se der, ainda fique em casa!
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