Os vizinhos

Eu tenho um casal de vizinhos que é bem transão. Eles são hétero, o que é uma pena, porque o gemido da mulher é uma delícia. São o “casal picadinho”.

A primeira vez que a ouvi gemendo foi na minha primeira noite no apartamento, quando me mudei. Achei inicialmente que era um acaso, uma coincidência, e interpretei aqueles gemidos notívagos, que me acordaram, como uma espécie de recepção de boas-vindas. Com o tempo vi que não, eles são transão mesmo. E aí ouvir os gemidos atrás da parede já faz parte da minha rotina há quase três anos.

É sempre ela que fica gemendo mais alto. A primeira vez que ele gemeu foi tão estranho que parecia que estava morrendo; a impressão que eu tive era a de que ela estava cortando os membros dele ainda vivo, e devia ser horrível, considerando os sons que ele emitia. Nesse dia veio o apelido: “picadinho”.

E aí aconteceu de escolhermos a mesma parede para encostar nossas camas, e teve uma vez que foi bem interessante porque eu também estava acompanhada, e os horários casaram, e era eu gemendo, a gatinha, a vizinha e lá no fundo, o picadinho. Os quatro se pegando e gemendo ao mesmo tempo. Parecia uma suruba, foi ótimo.

Eu reconheceria os sons da intimidade deste casal em qualquer parte do mundo, mas não os distinguiria dos demais se o quesito fosse, sei lá, a aparência. A gente se tromba de vez em quando no corredor, mas é raro. Ela mesmo eu fui ver pela primeira vez poucos meses atrás. É linda. Droga.

Às vezes me frustro de ser obrigada a checar a frequência sexual de pessoas que nem conheço. Sim, dá uma dorzinha de cotovelo. Mas não sou do tipo mal amada, e tento sempre mudar o foco. Ainda mais agora que os dois estão em casa o tempo todo, e se pegam também durante o dia. Parece martelada de reforma, mas é só a cabeceira da cama contra a parede.

Eu sigo aqui – o que posso fazer? Viver em sociedade tem dessas coisas...  Só espero nunca encontrar por aí um texto escrito por alguém que se esconde atrás de um pseudônimo falando de mim como vizinha.



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